Melville |
1830 - O empório de Allan Melville vai à falência, e a família se muda para Albany.
1832 - Morre Allan Melville. Herman deixa a escola e arranja um emprego em um banco.
1834 - Passa a trabalhar como guarda-livros do irmão mais velho, Gansevoort.
1835 - Frequenta o Colégio Clássico de Albany.
1837 - O irmão Gansevoort vai à falência, e a família se muda para Lansingburgh.
1839 - Herman consegue emprego como camareiro no navio mercante St. Lawrence.
1841 - Embarca no baleeiro Acushmet com destino aos mares do Sul.
1842 - Em julho, o Acushnet aporta nas ilhas Marquesas (atual Polinésia Francesa). Herman e um amigo abandonam o navio para explorar a ilha.
1843 - Alista-se na Marinha e embarca no United States.
1846 - Publica Taipi - Paraíso de Canibais, sobre a vida da Polinésia.
1847 - Publica Omu, uma narrativa das aventuras nos mares do Sul. Em agosto, casa-se com Elisabeth Shaw.
1849 - Publica Mardi e Redburn.
1850 - Publica White Jacker.
1851 - Publica Moby Dick (*).
1852 - Publica Pierre ou As Ambiguidades.
1853 - Publica Bartleby, o Escriturário.
1854 - Publica As Encantadas.
1855 - Publica Israel Potter e Benito Cereno.
1856 - Faz uma viagem à Europa e à África. Publica Piazza Tales.
1857 - Publica The Confidence Man.
1866 - Publica Battle-Pieces e Aspectos da Guerra.
1867 - O segundo filho, Stanwix, que fora para o mar em 1869, morre num hospital em São Francisco.
1891 - Escreve Billy Budd, só publicado em 1924. Morre de infarto em 28 de setembro, em Nova York.
(*) Moby Dick
A descrição feita por Herman Melville, em 1851, da caça à baleia-branca é uma alegoria da luta do homem contra as forças da natureza, avassaladoras e destruidoras, que, no entanto, se encontram presentes dentro do próprio homem. Nem a obra nem o autor foram compreendidos à época, o que fez de Moby Dick um fracasso.
O tempo se encarregaria de fazer justiça: Moby Dick é considerado por muitos, hoje, o maior romance já escrito nos Estados Unidos.
No primeiro dia de agosto de 1819, em Nova York, Maria Gansevoort Melville dá a luz ao terceiro filho, Herman. Depois dele outros cinco viriam. Tanto o avô paterno de Herman, de nobre família escocesa, quanto o materno, descendente de holandeses, haviam sido heróis na Revolução Americana de 1787.
O pai de Herman, Allan Melville, é dono de um empório, que, em 1830, vai à falência. A família então é obrgidada a se abrigar na casa de um parente, em Albany. Dois anos depois Allan morre deixando Maria e os oito filhos em péssima situação financeira. Gansevoort, o mais velho, envolve-se num negócio de peles, procurando ajudar na manutenção da casa; as meninas vão para a Academia Feminina de Albany. Com treze anos Herman arranja emprego num banco, depois de abandonar a escola.
Sai do estabelecimento bancário em 1834 para trabalhar como guarda-livros do irmão. As coisas seguem equilibradas até 1837, quando o negócio de Gansevoort também vai á falência. Herman passa a lecionar em Pittsfield, Massachusetts.
No ano seguinte a família transfere-se para a cidade vizinha de Lansingburgh, procurando melhores condições de vida. Herman vai para a Academia de Eengenharia, com o intuito de obter um emprego no canal Erie, mas desiste alguns meses depois.
Em 1839 publica no Democratic Press e no Lansigburgh Advertiser sua primeira composição literária, Fragmentos Literários de uma Escrivaminha, com o pseudônimo de L. A. V. É um trabalho simples, que revela um autor de estilo ainda indefinido mas com inclinações românticas.
Está com vinte anos de idade e sem perspectiva. Não se decide pro profissão alguma e seente-se frustrado por não poder ajudar no sustento da família. Tentando ajudá-lo, Gansevoort arranja-lhe um emprego de camareiro num navio mercante, o St. Lawrence. Em 5 de julho de 1839 Herman embarca rumo a Liverpool, na Inglaterra.
Algumas decepções o aguardam: os marujos não têm o menor refinamento. A vida a bordo é inglória e exaustiva. E Liverpool é uma cidade cheia de pobres que dormem famintos pelas ruas. Toda sua decepcionante experiência seria relatada mais tarde no livro Redburn, publicado em 1849. Além dos aspectos meramente descritivos da viagem, Herman acrescentaria à obra alguns episódios não acontecidos de fato, como uma visita do herói a Londres e uma epidemia a bordo.
Três meses depois da partida o St. Lawrence aporta de volta em Nova York, trazendo inúmeros imigrantes irlandeses. Herman desembarca frustrado e sai à procura de emprego. Consegue dar algumas aulas em Greenbush, no Etado de Nova York, mas pouco tempo depois a escola fecha, e ele vai para o colégio de Brunswick, perto de Albany. Ali fica até 1840, quando resolve tentar a sorte no Oeste.
No fim do ano, sem um vintém no bolso, retorna a Nova York. Volta a perambular pelas ruas, e seus passeios acabam por levá-lo a New Bedford, considerada a capital mundial dos baleeiros.
Em janeiro de 1841 Herman embarca no Acushnet, um veleiro com 35 metros de comprimento, equipado com oficina mecânica, carpintaria, sala de costura, e repleto de provisões. A tripulação é formada por imediatos, arpoadores e marinheiros. Todos eles participam da caça à baleia, tarefa perigosa e emocionante cuja finalidade é a extração do óleo. A experiência vivenciada no Acushnet inspiraria Herman a escrever dez anos depois sua obra-prima - Moby Dick -, cujo título original era A Baleia-Branca.
Ao deixar os Açores o Acushnet segue para o Atlântico Sul, fazendo uma escala no Peru em junho de 1841 e tomando depois o rumo do cabo Horn, e extremo meridional da América do Sul.
Num relato sobre as ilhas Encantadas (as Galápagos), Herman afirma ter visitado também, durante essa viagem, o arquipélago de João Fernandes. Nessa silhas, pertencentes ao governo chileno, teria vivido, de 1704 a 1709, o marinheiro Alexandre Selkirk, que inspirou a Daniel Defoe o famoso personagem Robison Crusoé.
Em julho de 1842 o Acushnet chega às ilhas Marquesas e apota em Nuku-Hiva, a ilha mais importante do arquipélago, que então se encontra sob domínio francês. Alguns dias depois Herman e seu amigo Richard Tobias Greene - "Toby" - abandonam o navio e começam a explorar a ilha com a intenção de encontrar a tribo dos hapaas, considerada amistosa aos marinheiros brancos. Escalam as latas colinas que circundam a baía de Taiohae e acabam nas mãos dos taipis, que, segundo se conta, são antropófagos.
Após alguns dias Toby tem permissão da tribo para procurar medicamentos para Herman, que está com a perna ferida. Não volta mais: engaja-se num baleeiro que está à procura de marinheiros desgarrados e vai embora. Um mês depois o baleeiro australiano Lucy Ann encontra Herman.
Essa experiência é relatada em seu livro Taipi - paraíso dos Canibais, publicado em 1846. Nesse romance em forma de reportagem o escritor conta o que lhe acontecera desde o momento em que deixa seu posto no Acushmet até o dia em que, salvo dos antropófagos, embarca no Lucy Ann. Descreve o modo de vida dos taipis a flora e a fauna da ilha. Somente na segunda parte do livro - após a partida de Toby - é que ele narra uma série de acontecimentos que fogem ao mero documentário.
A úncia pessoa com que Melville conveersa no Lucy Ann é o Dr. Long ou Long Ghost (Fantasma Comprido). Os marinheiros não querem trabalhar, aguardam apenas uma ocasião propícia para desertar. A primeira tentativa nesse sentido acontece em uma ilha das Marquesas, quando dez homens tentam fugir, mas não conseguem.
Enquanto o Lucy Ann vai navegando nesse clima caótico, Herman - com o pretexto da perna machucada - passa o tempo todo lendo os livros de seu amigo Fantasma Comprido. Somente suspende a leitura quando o navio chega a Papeete, no Taiti. Outra vez a tripulação se amotina, e dessa vez o capitação é subjugado e enviado a terra. Os marinheiros não querem prosseguir viagem no Lucy Ann, por isso solicitam ao cônsul inglês permissão para ficar na ilha. Em resposta são trancafiados nos cárceres do navio francês Reine-Blanche, inclusive Herman e o Fantasma.
Quase diariamente as autoridades da ilha procuram os rebeldes para tentar convencê-los a retornar seus postos no velho baleeiro australiano. Mas os marujos preferem permanecer encarcerados. Por fim, no dia 15 de outubro de 1842, recuperam a liberdade. O Lucy Ann já vai longe, tripulado por aventureiros que nada sabem sobre as duras condições do trabalho a bordo.
Livres, sem possibilidade imediata de embarcar em outro navio, Herman e o Fantasma passeiam pela ilha, observando a vida dos habitantes locais, que cultuam a indolência e a embriaguez e rejetam tenazmente qualquer sugestão de trabalho. Comem frutas silvestres, abundantes em seus campos férteis, e dormem em toscas tapera.
Avesso à indolência e a hábitos ociosos, é com imensa alegria que Herman, em janeiro de 1843, sobe a bordo de um baleeiro que havia aportado na ilha. Sente só uma tristeza: a de deixar o bom amigo Fantasma, que optara pela boa vida na ilha. Quatro anos mais tarde o romancista reviveria toda essa aventura em seu livro Omu (1847).
Segundo o relato do escritor, o baleeiro navega algum tempo pelos mares do Sul, antes de aportar em Honolulu, onde a tripulação desembarca para uma escala de quatro meses. O Havaí, bem como o Taiti, constituiam, na época, objeto de acirradas disputas entre ingleses, franceses e americanos, todos interessados no controle da região. Para não ser ludibriados pelos rivais na disputa do arquipélago, os Estados Unidos mantêm na ilha um destacamento naval. Em 17 de agosto de 1843 Herman alista-se na Marinha norte-americana em Honolulu e embarca no United States, um navio com 450 tripulantes, divididos numa hierarquia de graus e funções.
Quando o United States chega a Boston, em outubro de 1844, Herman é dispensado. A impressão que lhe ficara do rígido ambiente disciplinar da fragata americana seria exposta em White Jacket (Jaqueta Branca) em 1850.
Aos 25 anos de idade Herman já tem outras expectativas. Depois de quase quatro anos sem ver nenhum membro da família, sua primeira providência é visitar a mãe em Lansingburgh. O irmão mais velho é secretário da legação americana em Londres. As irmãs continuam solteiras.
Atenuada a emoção dos contatos familiares, põe-se a escrever. Não quer mais saber de lecionar. Afinal, tem aventuras suficientes para escrever vários livros. O primeiro é Taipi - Paraíso de Canibais (1846). A experiência serve para mostrar-lhe as dificuldades ligadas ao ramo editorial: ninguém quer publicá-lo. A conselho de um amigo, envia os manuscritos para Gansevoort. Alguns meses depois o irmão manda-lhe boas notícias: o editor John Murray comprara Taipi. As cinco libras que chegam com a carta são apenas uma parte do pagamento das cem que lhe serão enviadas nos próximos sete meses.
Mas o editor manifesta a intenção de cortar várias passagens do livro, pondo em dúvida sua veracidade. No auge das discussões, aparece o velho amigo Toby, que comprova as situações relatadas no romance. As coisas se resolvem, e Herman aproveita para acrescentar à edição americana a História de Toby, onde conta o que acontecera ao amigo depois de sua partida de Nuku-Hiva.
Tudo parece ir muito bem quando, subitamente, em 12 de maio de 1846, Gansevoort morre. E Herman continua a escrever. Seu livro seguinte, Omu )no dialeto das ilhas Marquesas, omoo significa "vagabundo"), encontra outro tipo de dificuldade: o editor recusa-se a publicar uma obra que afirma que o cristianismo falhara na Polinésia. Acaba sendo impresso, em 1847, pela Harper & Brothers, de Nova York.
Em agosto de 1847 Herman casa-se com Elisabeth Shaw, filha de um oficial de justiça, amigo da família. O ex-aventureiro decide-se por uma tranquila vida doméstica. Fixa residência em Nova York e retoma um livro que iniciara pouco antes do casamento: Mardi. No prefácio esclarece que resolvera escrever um verdadeiro romance de aventuras polinésias para verificar se não era possível fazer à fantasia passar por realidade - justamente o inverso do que havia feito nos dois primeiros livros.
Em Mardi Herman Melville coloca suas dúvidas em relação aos valores de seu tempo: "O mal é a doença crônica do universo". Essa afirmação seria o ponto chave de toda sua obra. Publicado em 1849, Mardi decepciona críticos e leitores, que esperavam uma sequência das ingênuas aventuras dos livros anteriores, e não uma crítica dos valores estabelecidos da época.
Todavia, antes da publicação, Herman já começara a escrever outro livro, que, segundo ele, tinha tudo para ser um sucesso estrondoso. Como nascera seu primeiro filho - Malcom - e ele estava mesmo precisando de dinheiro, dedica-se à composição de Redburn, o relato de sua primeira vigem de barco de Nova York a Liverpool.
É ali, entre plantas, árvores e animais, que começa a elaborar A Baleia-Branca, cujo título seria depois alterado para Moby Dick. É a história do capitão Acab, comandante do baleeiro Pequod, contra Moby Dick, a baleia branca. Acab tinha vivido uma vida de solidão durante quarenta anos. Casara-se muito tarde e em seguida partira para o mar. Seu maior desejo era vingar-se da baleia que lhe arrancara uma perna.
Todas as experiências de Herman no baleeiro Acushnet estão presentes no livro. No entanto, o sentido mais profundo da obra é a eterna procura do homem, o combate instintivo e intenso contra as forças do mal, o anseio de pureza, e por fim a amarga desilusão: a terra não é nem nunca virá a ser um paraíso. Tudo isso Herman combina com uma excitante história de aventuras, que é publicada na Inglaterra em 1851, mesmo ano do nascimento de seu segundo filho, Stanwix.
Em 1852 Herman publica um livro controverso: Pierre ou As Ambiguidades. É ridicularizado e denunciado como louco e imoral. Aliás, para a maioria dos leitores, o próprio Melville está louco. Na verdade, o escritor está sofrendo um forte depressão nervosa. Sempre acreditara nos ensinamentos de Cristo e na bondade dos homens. Agora está em crise com suas crenças.
Nem o nascimento da filha Elisabeth, em 1853, consegue melhorar seu ânimo. Ao contrário: as coisas andam difíceis, e há mais uma criança para sustentar. Pede a ajuda de amigos para arranjar um emprego fixo, mas nada consegue. Passa então a escrever uma série de contos, que publica anonimamente nas revistas literárias.
Dois anos depois, em 1855, nasce Frances, seu quarto filho. Nessa época Herman escreve uma pequena obra-prima: Benito Cereno. No ano seguinte reúne vários contos, alguns ainda inédiots, outros já publicados em revistas, e edita-os sob o título Piazza Tales (Contos da Praça).
Faz-lhe falta viajar, dar uma volta ao mundo, deixar por algum tempo a quietude e a rotina de Arrowhead. Então, em 1856 Herman novamente se põe a caminho, pelo mar, e visita o norte da África e a Europa. Ao retornar, relata as impressões da viagem em Diário dos Estreitos, no qual fala em detalhes de Gibraltar, Dardanelos e Bósforo.
Mal Herman conclui essa obra, explode nos Estados Unidos a Guerra Civil (1861-1865), que ele descreve como um trágico espetáculo em Do Alto de uma Casa e Réquiem. Em 1857 lança o romance The Confidence Man (Um Homem de Confiança), em que se percebe claramente a intensa misantropia em que vive. Mas o escritor já não tem entusiasmo pela vida. Apenas por amor à família esforça-se para obter um emprego como inspetor da Alfândega de Nova York, em 1866. No início do ano seguinte, recebe um duro golpe: seu filho Malcolm, de apenas dezoito anos, tira a própria vida com um tiro.
Herman só volta a escrever muito tempo depois, para iniciar a composição de sua última obra de fôlego: Clarel, um relato em versos baseado numa viagem que fizera á Terra Santa em 1857. No poema está expressa a idéia de que não adianta sonhar com uma ordem social se a ignorância e o orgulho não foram superados dentro de cada ser humano.
Nenhum editor se dispõe a arriscar seu capital para publicar a obra. É Peter Gansevoort, tio do escritor, quem acaba financiando a edição, em 1876.
Em 1888, com 68 anos, Herman se aposenta da Alfândega. Sente-se já no fim da vida. "Eles falam da dignidade do trabalho. Pura mistificação. O trabalho, para dizer a verdade, é uma necessidade para nossa pobre condição terrestre. A dignidade encontra-se no lazer. Aliás, noventa e nove por cento de todo trabalho realizado neste mundo e tolo ou inútil".
Livre dos compromissos burocráticos, Herman dedica seus últimos anos à elaboração de Billy Budd, mais uma história do mar, que só seria publicada postumamente. Pouco tempo depois de concluí-la, Herman Melville parte para sua última e inadiável viagem. Em 28 de setembro de 1891 sofre um ataque cardíaco fatal. Nenhum jornal publica a notícia de sua morte. Somente muitos anos mais tarde ele receberia os aplausos que amais lhe tributaram em vida, e um escritor consagrado como Camus diria: "Para avaliar o gênio de Melville, é indispensável admitir que suas obras traçam uma experiência espiritual de intensidade sem igual e que são em parte simbólicas. Seus livros admiráveis são desses excepcionais que podem ser lidos de diferentes maneiras, ao mesmo tempo evidentes e misteriosos, obscuros e, todavia, límpidos como água cristalina. A criança e o sábio encontram neles alimento".
Fonte: coleção obras-primas - grandes autores - vida e obra.
Algumas decepções o aguardam: os marujos não têm o menor refinamento. A vida a bordo é inglória e exaustiva. E Liverpool é uma cidade cheia de pobres que dormem famintos pelas ruas. Toda sua decepcionante experiência seria relatada mais tarde no livro Redburn, publicado em 1849. Além dos aspectos meramente descritivos da viagem, Herman acrescentaria à obra alguns episódios não acontecidos de fato, como uma visita do herói a Londres e uma epidemia a bordo.
Três meses depois da partida o St. Lawrence aporta de volta em Nova York, trazendo inúmeros imigrantes irlandeses. Herman desembarca frustrado e sai à procura de emprego. Consegue dar algumas aulas em Greenbush, no Etado de Nova York, mas pouco tempo depois a escola fecha, e ele vai para o colégio de Brunswick, perto de Albany. Ali fica até 1840, quando resolve tentar a sorte no Oeste.
No fim do ano, sem um vintém no bolso, retorna a Nova York. Volta a perambular pelas ruas, e seus passeios acabam por levá-lo a New Bedford, considerada a capital mundial dos baleeiros.
Em janeiro de 1841 Herman embarca no Acushnet, um veleiro com 35 metros de comprimento, equipado com oficina mecânica, carpintaria, sala de costura, e repleto de provisões. A tripulação é formada por imediatos, arpoadores e marinheiros. Todos eles participam da caça à baleia, tarefa perigosa e emocionante cuja finalidade é a extração do óleo. A experiência vivenciada no Acushnet inspiraria Herman a escrever dez anos depois sua obra-prima - Moby Dick -, cujo título original era A Baleia-Branca.
Ao deixar os Açores o Acushnet segue para o Atlântico Sul, fazendo uma escala no Peru em junho de 1841 e tomando depois o rumo do cabo Horn, e extremo meridional da América do Sul.
Num relato sobre as ilhas Encantadas (as Galápagos), Herman afirma ter visitado também, durante essa viagem, o arquipélago de João Fernandes. Nessa silhas, pertencentes ao governo chileno, teria vivido, de 1704 a 1709, o marinheiro Alexandre Selkirk, que inspirou a Daniel Defoe o famoso personagem Robison Crusoé.
Em julho de 1842 o Acushnet chega às ilhas Marquesas e apota em Nuku-Hiva, a ilha mais importante do arquipélago, que então se encontra sob domínio francês. Alguns dias depois Herman e seu amigo Richard Tobias Greene - "Toby" - abandonam o navio e começam a explorar a ilha com a intenção de encontrar a tribo dos hapaas, considerada amistosa aos marinheiros brancos. Escalam as latas colinas que circundam a baía de Taiohae e acabam nas mãos dos taipis, que, segundo se conta, são antropófagos.
Após alguns dias Toby tem permissão da tribo para procurar medicamentos para Herman, que está com a perna ferida. Não volta mais: engaja-se num baleeiro que está à procura de marinheiros desgarrados e vai embora. Um mês depois o baleeiro australiano Lucy Ann encontra Herman.
Essa experiência é relatada em seu livro Taipi - paraíso dos Canibais, publicado em 1846. Nesse romance em forma de reportagem o escritor conta o que lhe acontecera desde o momento em que deixa seu posto no Acushmet até o dia em que, salvo dos antropófagos, embarca no Lucy Ann. Descreve o modo de vida dos taipis a flora e a fauna da ilha. Somente na segunda parte do livro - após a partida de Toby - é que ele narra uma série de acontecimentos que fogem ao mero documentário.
A úncia pessoa com que Melville conveersa no Lucy Ann é o Dr. Long ou Long Ghost (Fantasma Comprido). Os marinheiros não querem trabalhar, aguardam apenas uma ocasião propícia para desertar. A primeira tentativa nesse sentido acontece em uma ilha das Marquesas, quando dez homens tentam fugir, mas não conseguem.
Enquanto o Lucy Ann vai navegando nesse clima caótico, Herman - com o pretexto da perna machucada - passa o tempo todo lendo os livros de seu amigo Fantasma Comprido. Somente suspende a leitura quando o navio chega a Papeete, no Taiti. Outra vez a tripulação se amotina, e dessa vez o capitação é subjugado e enviado a terra. Os marinheiros não querem prosseguir viagem no Lucy Ann, por isso solicitam ao cônsul inglês permissão para ficar na ilha. Em resposta são trancafiados nos cárceres do navio francês Reine-Blanche, inclusive Herman e o Fantasma.
Quase diariamente as autoridades da ilha procuram os rebeldes para tentar convencê-los a retornar seus postos no velho baleeiro australiano. Mas os marujos preferem permanecer encarcerados. Por fim, no dia 15 de outubro de 1842, recuperam a liberdade. O Lucy Ann já vai longe, tripulado por aventureiros que nada sabem sobre as duras condições do trabalho a bordo.
Livres, sem possibilidade imediata de embarcar em outro navio, Herman e o Fantasma passeiam pela ilha, observando a vida dos habitantes locais, que cultuam a indolência e a embriaguez e rejetam tenazmente qualquer sugestão de trabalho. Comem frutas silvestres, abundantes em seus campos férteis, e dormem em toscas tapera.
Avesso à indolência e a hábitos ociosos, é com imensa alegria que Herman, em janeiro de 1843, sobe a bordo de um baleeiro que havia aportado na ilha. Sente só uma tristeza: a de deixar o bom amigo Fantasma, que optara pela boa vida na ilha. Quatro anos mais tarde o romancista reviveria toda essa aventura em seu livro Omu (1847).
Segundo o relato do escritor, o baleeiro navega algum tempo pelos mares do Sul, antes de aportar em Honolulu, onde a tripulação desembarca para uma escala de quatro meses. O Havaí, bem como o Taiti, constituiam, na época, objeto de acirradas disputas entre ingleses, franceses e americanos, todos interessados no controle da região. Para não ser ludibriados pelos rivais na disputa do arquipélago, os Estados Unidos mantêm na ilha um destacamento naval. Em 17 de agosto de 1843 Herman alista-se na Marinha norte-americana em Honolulu e embarca no United States, um navio com 450 tripulantes, divididos numa hierarquia de graus e funções.
Quando o United States chega a Boston, em outubro de 1844, Herman é dispensado. A impressão que lhe ficara do rígido ambiente disciplinar da fragata americana seria exposta em White Jacket (Jaqueta Branca) em 1850.
Aos 25 anos de idade Herman já tem outras expectativas. Depois de quase quatro anos sem ver nenhum membro da família, sua primeira providência é visitar a mãe em Lansingburgh. O irmão mais velho é secretário da legação americana em Londres. As irmãs continuam solteiras.
Atenuada a emoção dos contatos familiares, põe-se a escrever. Não quer mais saber de lecionar. Afinal, tem aventuras suficientes para escrever vários livros. O primeiro é Taipi - Paraíso de Canibais (1846). A experiência serve para mostrar-lhe as dificuldades ligadas ao ramo editorial: ninguém quer publicá-lo. A conselho de um amigo, envia os manuscritos para Gansevoort. Alguns meses depois o irmão manda-lhe boas notícias: o editor John Murray comprara Taipi. As cinco libras que chegam com a carta são apenas uma parte do pagamento das cem que lhe serão enviadas nos próximos sete meses.
Mas o editor manifesta a intenção de cortar várias passagens do livro, pondo em dúvida sua veracidade. No auge das discussões, aparece o velho amigo Toby, que comprova as situações relatadas no romance. As coisas se resolvem, e Herman aproveita para acrescentar à edição americana a História de Toby, onde conta o que acontecera ao amigo depois de sua partida de Nuku-Hiva.
Tudo parece ir muito bem quando, subitamente, em 12 de maio de 1846, Gansevoort morre. E Herman continua a escrever. Seu livro seguinte, Omu )no dialeto das ilhas Marquesas, omoo significa "vagabundo"), encontra outro tipo de dificuldade: o editor recusa-se a publicar uma obra que afirma que o cristianismo falhara na Polinésia. Acaba sendo impresso, em 1847, pela Harper & Brothers, de Nova York.
Em agosto de 1847 Herman casa-se com Elisabeth Shaw, filha de um oficial de justiça, amigo da família. O ex-aventureiro decide-se por uma tranquila vida doméstica. Fixa residência em Nova York e retoma um livro que iniciara pouco antes do casamento: Mardi. No prefácio esclarece que resolvera escrever um verdadeiro romance de aventuras polinésias para verificar se não era possível fazer à fantasia passar por realidade - justamente o inverso do que havia feito nos dois primeiros livros.
Em Mardi Herman Melville coloca suas dúvidas em relação aos valores de seu tempo: "O mal é a doença crônica do universo". Essa afirmação seria o ponto chave de toda sua obra. Publicado em 1849, Mardi decepciona críticos e leitores, que esperavam uma sequência das ingênuas aventuras dos livros anteriores, e não uma crítica dos valores estabelecidos da época.
Todavia, antes da publicação, Herman já começara a escrever outro livro, que, segundo ele, tinha tudo para ser um sucesso estrondoso. Como nascera seu primeiro filho - Malcom - e ele estava mesmo precisando de dinheiro, dedica-se à composição de Redburn, o relato de sua primeira vigem de barco de Nova York a Liverpool.
É ali, entre plantas, árvores e animais, que começa a elaborar A Baleia-Branca, cujo título seria depois alterado para Moby Dick. É a história do capitão Acab, comandante do baleeiro Pequod, contra Moby Dick, a baleia branca. Acab tinha vivido uma vida de solidão durante quarenta anos. Casara-se muito tarde e em seguida partira para o mar. Seu maior desejo era vingar-se da baleia que lhe arrancara uma perna.
Todas as experiências de Herman no baleeiro Acushnet estão presentes no livro. No entanto, o sentido mais profundo da obra é a eterna procura do homem, o combate instintivo e intenso contra as forças do mal, o anseio de pureza, e por fim a amarga desilusão: a terra não é nem nunca virá a ser um paraíso. Tudo isso Herman combina com uma excitante história de aventuras, que é publicada na Inglaterra em 1851, mesmo ano do nascimento de seu segundo filho, Stanwix.
Em 1852 Herman publica um livro controverso: Pierre ou As Ambiguidades. É ridicularizado e denunciado como louco e imoral. Aliás, para a maioria dos leitores, o próprio Melville está louco. Na verdade, o escritor está sofrendo um forte depressão nervosa. Sempre acreditara nos ensinamentos de Cristo e na bondade dos homens. Agora está em crise com suas crenças.
Nem o nascimento da filha Elisabeth, em 1853, consegue melhorar seu ânimo. Ao contrário: as coisas andam difíceis, e há mais uma criança para sustentar. Pede a ajuda de amigos para arranjar um emprego fixo, mas nada consegue. Passa então a escrever uma série de contos, que publica anonimamente nas revistas literárias.
Dois anos depois, em 1855, nasce Frances, seu quarto filho. Nessa época Herman escreve uma pequena obra-prima: Benito Cereno. No ano seguinte reúne vários contos, alguns ainda inédiots, outros já publicados em revistas, e edita-os sob o título Piazza Tales (Contos da Praça).
Faz-lhe falta viajar, dar uma volta ao mundo, deixar por algum tempo a quietude e a rotina de Arrowhead. Então, em 1856 Herman novamente se põe a caminho, pelo mar, e visita o norte da África e a Europa. Ao retornar, relata as impressões da viagem em Diário dos Estreitos, no qual fala em detalhes de Gibraltar, Dardanelos e Bósforo.
Mal Herman conclui essa obra, explode nos Estados Unidos a Guerra Civil (1861-1865), que ele descreve como um trágico espetáculo em Do Alto de uma Casa e Réquiem. Em 1857 lança o romance The Confidence Man (Um Homem de Confiança), em que se percebe claramente a intensa misantropia em que vive. Mas o escritor já não tem entusiasmo pela vida. Apenas por amor à família esforça-se para obter um emprego como inspetor da Alfândega de Nova York, em 1866. No início do ano seguinte, recebe um duro golpe: seu filho Malcolm, de apenas dezoito anos, tira a própria vida com um tiro.
Herman só volta a escrever muito tempo depois, para iniciar a composição de sua última obra de fôlego: Clarel, um relato em versos baseado numa viagem que fizera á Terra Santa em 1857. No poema está expressa a idéia de que não adianta sonhar com uma ordem social se a ignorância e o orgulho não foram superados dentro de cada ser humano.
Nenhum editor se dispõe a arriscar seu capital para publicar a obra. É Peter Gansevoort, tio do escritor, quem acaba financiando a edição, em 1876.
Em 1888, com 68 anos, Herman se aposenta da Alfândega. Sente-se já no fim da vida. "Eles falam da dignidade do trabalho. Pura mistificação. O trabalho, para dizer a verdade, é uma necessidade para nossa pobre condição terrestre. A dignidade encontra-se no lazer. Aliás, noventa e nove por cento de todo trabalho realizado neste mundo e tolo ou inútil".
Livre dos compromissos burocráticos, Herman dedica seus últimos anos à elaboração de Billy Budd, mais uma história do mar, que só seria publicada postumamente. Pouco tempo depois de concluí-la, Herman Melville parte para sua última e inadiável viagem. Em 28 de setembro de 1891 sofre um ataque cardíaco fatal. Nenhum jornal publica a notícia de sua morte. Somente muitos anos mais tarde ele receberia os aplausos que amais lhe tributaram em vida, e um escritor consagrado como Camus diria: "Para avaliar o gênio de Melville, é indispensável admitir que suas obras traçam uma experiência espiritual de intensidade sem igual e que são em parte simbólicas. Seus livros admiráveis são desses excepcionais que podem ser lidos de diferentes maneiras, ao mesmo tempo evidentes e misteriosos, obscuros e, todavia, límpidos como água cristalina. A criança e o sábio encontram neles alimento".
Fonte: coleção obras-primas - grandes autores - vida e obra.
Acho que Moby Dick deveria ser leitura obrigatória! Principalmente quando se chega aos 40. Bj
ResponderExcluir