terça-feira, 13 de novembro de 2018

Lêdo Ivo

Ignoro o quinhão que me coube na partilha
de tantos bens dispersos entre a luz raiante
e a névoa que mascara a borra dos naufrágios.



Lêdo Ivo

Nasce no dia 18 de fevereiro, em Maceió - AL, faleceu em 23 de dezembro de 2012.

Mesmo tendo nascido numa família sem tradição literária, desde a infância Lêdo Ivo manifestou o desejo de ser escritor. Quando se mudou com a família para o Recife, aos 16 anos de idade, passou a colaborar com a imprensa local e participou de um grupo literário do qual fazia parte o escritor e crítico literário Willy Lewin.


Influenciado por autores como Ribeiro Couto, Telmo Vergara, Monteiro Lobato e Luís Jardim, Lêdo Ivo queria ser contista. Mas, por sugestão de um amigo, parou de escrever contos e se voltou para a poesia. A experiência neste outro gênero literário definiu a sua linguagem - poemas de versos longos -, muito próxima da prosa. "Você pode ser prosador e poeta", afirma Lêdo Ivo.

Em 1943, o escritor mudou-se para o Rio de Janeiro, onde se matriculou na Faculdade Nacional de Direito e se formou em 1949. Entretanto, nunca exerceu a profissão. Ainda na faculdade, passou a colaborar em suplementos literários e a trabalhar como jornalista. Foi relator da Tribuna da Imprensa e da revista Manchete, colaborador de O Estado de S. Paulo e editorialista do Correio da Manhã.

Lêdo Ivo estreou na literatura em 1943, com o livro As imaginações. Naquela época, já frequentava o grupo de escritores que se reunia no consultório de Jorge de Lima, tornando-se amigo de Manuel Bandeira, Murilo Mendes, Graciliano Ramos e, especialmente, José Lins do Rêgo, com quem almoçava semanalmente.

Em 1945, recebeu o prêmio Olavo Bilac, da Academia Brasileira de Letras, pela publicação de Ode e elegia. Este seria o primeiro de uma série de prêmios que o poeta iria conquistar, como o Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro.

No início de 1953, Lêdo Ivo mudou-se para Paris, só retornando em outubro do ano seguinte. Em 1963, a convite do governo norte-americano, fez uma viagem de dois meses pelos Estados Unidos, onde realizou palestras em universidades.

Embora reconhecido como um dos poetas mais representativos da Geração de 45, "o espírito da poesia de Lêdo Ivo por vezes concorda e às vezes repele o de sua geração", observa o ensaísta Péricles Eugênio da Silva Ramos. "Isso porque poesia, para ele, equivale a um convite à aventura."

Em 1986, Lêdo Ivo foi eleito para a cadeira n. 10 da Academia Brasileira de Letras. Lançou, em 2000, o livro O rumor da noite, uma reunião de 100 poemas inéditos. Sobre o livro, falou o poeta: "Minha noite, de homem e de poeta, está cercada de rumores: os rumores do mundo, da memória, do instante que passa. E principalmente do rumor do vento."


Curiosidade
Ao comentar sobre a Geração de 45, Sérgio Buarque de Holanda disse que era uma geração de poetas com nomes compridos e versos curtos - como João Cabral de Melo Neto, Péricles Eugênio da Silva Ramos e Paulo Mendes Campos - mas que, singularmente, havia um poeta de nome curto, chamado Lêdo Ivo, que escrevia versos longos.


"... 'O poeta mente a verdade.'' (...) Queira o leitor perdoar, mas entrei nesse cipoal de sutilezas depois de virar a última página de um livro de poemas intitulado Um brasileiro em Paris e o rei da Europa. O autor é Lêdo Ivo. (...) Aliás, a veraz mentira está claramente exposta no poema-chave do livro, aquele Alfabeto, que deveria ser dedicado amim, e não a José Lins do Rêgo; vou nesse sentido mover uma ação sumária contra o poeta."
Manuel Bandeira


ASILO SANTA LEOPOLDINA

Todos os dias volto a Maceió.
Chego nos navios desaparecidos, nos trens sedentos,
                                               nos aviões cegos que só
                                               aterrizam ao anoitecer.
Nos coretos das praças brancas passeiam caranguejos.
Entre as pedras das ruas escorrem rios de açúcar
fluindo docemente dos sacos armazenados nos trapiches
e clareiam o sangue velho dos assassinados.
Assim que desembarco tomo o caminho do hospício.
Na cidade em que meus ancestrais repousam em
                                            cemitérios marinhos
só os loucos de minha infância continuam vivos e
                                         à minha espera.
Todos me reconhecem e me saúdam com grunhidos
e gestos obscenos ou espalhafatosos.
Perto, no quartel, a corneta que chia
separa o pôr-do-sol da noite estrelada.
Os loucos langorosos dançam e cantam entre as grades.
Aleluia! Aleluia! Além da piedade
a ordem do mundo fulge como uma espada.
E o vento do mar oceano enche os meus olhos
                                             de lágrimas.



Obras do autor

POESIA: As imaginações, 1944; Ode e elegia, 1945; Acontecimento do soneto, 1948; Ode ao crepúsculo, 1948; Cântico, 1949; Linguagem, 1951; Ode equatorial, 1951; Um brasileiro em Paris e O rei da Europa, 1955; Magias (contendo Os amantes sonoros), 1960; Uma lira dos vinte anos, 1962; Estação central, 1964; Finisterra, 1972; O sinal semafórico, 1974; O soldado raso, 1980; A noite misteriosa, 1982; Calabar, 1985; Mar oceano, 1987; Crepúsculo civil, 1990; Curral de peixe, 1995; O rumor da noite, 2000.

ROMANCE: As alianças, 1947; O caminho sem aventura, 1948; O sobrinho do general, 1964; Ninho de cobras, 1973; A morte do Brasil, 1984.

ENSAIO: Lição de Mário de Andrade, 1951; O preto no branco, 1955; O girassol às avessas, 1960; Paraísos de papel, 1961; Ladrão de flor, 1963; O universo poético de Raul Pompéia, 1963; Poesia observada, 1967; Modernismo e modernidade, 1972; Teoria e celebração, 1976; Alagoas, 1976; A ética da aventura, 1982; A república da desilusão, 1995.

OUTRAS: A cidade e os dias (crônicas), 1957; Use a passagem subterrânea (contos), 1961; Confissões de um poeta (autobiografia), 1979; O aluno relapso (autobiografia), 1991.


Fonte: 100 Anos de Poesia - Um panorama da poesia brasileira no século XX - Volume II - organização Claufe Rodrigues e Alexandra Maia - O verso Edições - 2001 - Rio de Janeiro.

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