domingo, 4 de setembro de 2011

Rainer Maria Rilke -
Cartas do poeta sobre a vida



Rilke, Rainer Maria (1875-1926) - Cartas do poeta sobre a vida: a sabedoria de Rilke / organização Ulrich Baer; tradução Milton Camargo Mota. - São Paulo : Martins 2007 (Coleção Prosa).

 "Pois arte é infância. Arte significa não saber que o mundo já é, e fazer um. Não destruir nada que se encontra, mas simplesmente não achar nada pronto. Nada mais que possibilidades. Nada mais que desejos. E, de repente, ser realização, ser verão, ter sol. Sem que se fale disso, involuntariamente. Nunca ter terminado. Nunca ter o sétimo dia. Nunca ver que tudo é bom. Insatisfação é juventude."
(sobre arte - Rainer Maria Rilke)

O poeta Rainer Maria Rilke, famoso pelos versos majestosos de seus poemas e de suas elegias, foi também um grande epistológrafo. Sua correspondência - que abrange as Cartas a um jovem poeta, reeditadas várias vezes no Brasil - conta com quase 11 mil missivas. A seleção, diretamente do original alemão, privilegia reflexões do poeta sobre o trabalho, a adversidade, a infância, a solidão, a doença, a morte, a linguagem, a arte, a fé, a moral, o amor a existência e quer ser um guia para a vida. Mas um guia ousado e refinado, como só as reflexões de um grande poeta conseguem ser.

"Afora minha voz que aponta além de mim, há ainda o som desse pequeno anseio que se origina em minha solidão e que ainda não dominei por completo, um tom tristesibilante que sobra através de uma fenda nessa solidão mal vedada - ele clama ai, e evoca os ouros até mim!"


Difícil selecionar o melhor de Rilker, cuja obra captou a imaginação de músicos, filósofos, artistas, escritores e amantes da poesia, e estabeleceu o alcance da poesia a pessoas raramente interessadas em elocuções humanas versificadas.

"Não há força no mundo exceto o amor, e, quando o carregamos em nós, simplesmente o temos, mesmo que fiquemos perplexos sobre como usá-lo: ele exerce seu efeito, irradia e ajuda para fora e além de nós. Não se deve jamais perder essa fé, é preciso simplesmente (e se não fosse nada mais) resistir nela!"

Rilke tem uma habilidade de tocar pessoas tão diferentes como se cada palavra tivesse sido escrita só para elas, talvez por isto a longa trajetória de sua vida ligada à peculiar e sistemática escrita, chamadas de realizações mais urgentes, pois não tinham a intenção de alcançar o público erudito leitor de poesia, mas tão somente interagir com as mais variadas camadas sociais (estima-se que sua correspondencia total, que ainda aguarda publicação e, em alguns caoss, a expiração dos direitos autorais mantidos pelos destinatários, abranja aproximadamente 11 mil cartas) que lhe solicitassem a palavra e que de certa forma faziam parte de seu crescimento quanto indivíduo e profissional visto que muito dos temas e filosofia meditados nas mesmas eram bases para seus futuros poemas e livros.

"Na vida, sempre é possível despertar mais uma vez o senso de um começo para nós. Para isso são necessárias tão poucas mudanças externas, pois realmente mudamos o mundo a partir de nosso coração. Se ele apenas desejar ser novo e imensurável, o mundo será imediatamente o mesmo do dia de sua criação e infinito."

A força das cartas de Rilke resulta de sua consciência de que sua vida e seu "mundo", num sentido profundo, o ultrapassavam e o excediam. É isso que constitui a riqueza da vida para todos nós; é também o que pode torná-la difícil. A razão pela qual o mundo "nos ultrapassa" é que fazemos escolhas e formamos intenções que são simplesmente varridas pelo que acontece; recorremos a nomes e títulos e buscamos felicidade, mas todas esss formas de refúgio podem se revelar transitórias. Nossos modos de compartimentar o mundo e o fato de não vermos com equanimidade cada um de seus aspectos sem preferência julgamento ou distração, escreve Rilke em 5 de janeiro de 1921, "mostram que estamos errados, nos tornam culpados, nos matam." A noção de Rilke de "culpabilidade" permite-lhe formular uma visão da vida que é mais inegrada do que a maneira como ele de fato vivia; a força de suas palavras resulta da tensão entre essa ênfase na aceitação e suas preferências igualmente fortes em relação ao mundo à sua volta. Mundo que foi para o mesmo de difícil vivência, considerando suas próprias vivências, base para a troca com o outro que se fez tão presente na sua extensa missiva.

Rainer Maria Rilke (Praga, 1875-1926). Considerado o melhor poeta de língua alemã do século XX, foi secretário de Auguste Rodin e viajou por vários países, inclusive pela Rússia e pelo Norte da África. Suas principais obras são Sonetos a Orfeu, Elegias de Duíno e Cartas a um jovem poeta.

Ulrich Baer (Alemanha, 1966). Professor de literatura comparada e de língua e literatura alemãs na New York University, é autor de Remnants of song: Trauma and the experience of modernity in Charles Baudelaire and Paul Célan e Spectral evidence: The photography of trauma. É editor de 110 stories: New York writes after september 11.

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