sexta-feira, 9 de julho de 2010

Lélia Coelho Frota - Pequeno Dicionário - Da Arte do Povo Brasileiro - Século XX



Lélia Coelho Frota - Pequeno Dicionário - Da Arte do Povo Brasileiro - Século XX

Consigo imaginar a Lélia em um chalé, olhar pensativo, onde as montanhas se confundem com a tênue luz do dia, a meditar: 'Cultura popular', 'cultura culta', tão frágil fronteira os separa por ainda reinar o preconceito nas calorosas discussões até os dias de hoje. Que é arte, que é artesanato, o que é cultura e o que é pitoresco. Quais critérios os tem definido. Alta qualidade em um trabalho se o mesmo não for advindo de uma formação formal. Arte popular encontrada fora dos grandes centros urbanos, triste privilégio para as populações rurais, seria um preconceito estabelecido?

Lélia, a antropóloga e poeta resolve literalmente por mão às letras e diluir essas fronteiras, esclarecer equívocos e romper preconceitos. Em momento inusitado, avista seu caldeirão e resolve construir uma maravilhosa sopa de todas as letras, iniciativa pioneira em nosso país pela abrangência e profundidade, trazendo um panorama que será argumento definitivo em nosso país. Assim, mexendo seu caldo de letras das artes, procura abrir espaço, prestigiar artistas de profunda raiz popular, anônimos, por vezes, mas não menos que os ditos 'artistas cultos', provando neste recorte que não há fronteiras para o homem expressar sua visão do mundo - deste, em que vivemos, e de outros mundos possíveis, sonhados.

A escritora e crítica de arte Frota trabalhou há mais de 30 anos com a criação de fonte popular no Brasil. Publicou sobre o assunto livros pioneiros, como Mitopoética de nove artistas brasileiros, da década de 70, onde, pela primeira vez, se abriu espaço para que a obra de artistas importantes se visse a um tempo abordada sob os ângulos simultâneos da estética e das ciências sociais. Preocupação, dar voz aos artistas, com histórias de vida e olhar sobre a própria criação. Estudar ou simplesmente conhecer o universo extraordinário da visualidade de fonte popular no Brasil do século XX, é adentrar no trabalho de Lélia Coelho Frota, hoje fonte dessa referência.

Neste caldo, poderemos separar muitas saborosas colheradas. Passar a vida a produzir arte por necessidade de sobrevivência das mais variadas formas, quem já não o fez? Olho para a primeira fotografia na página de lado esquerdo iniciando o livro e me deparo com uma bela

"Colcha de retalhos 'Quilt' Dec. 70 1970s Parati, RJ Col. Alexandre Dacosta.

Na oportunidade, quem sabe uma colcha de fuxico (verificar ortografia) montaremos: Recorta-se um círculo em um papelão medido anteriormente por um vidro pequeno (pode ser de pimenta), onde a caneta faz o formato de círculo. Recorta-se o círculo com uma boa tesoura. O círculo será o padrão para o recorte do formato dos retalhos coloridos (geralmente separa-se novamente por textura de tecido onde o grosso não poderá ser confecionado junto ao fino, isto é, tecido jeans não poderá unir-se a tecido de algodão fino, p. ex.). Agulha, linha, alinhava-se o círculo, fazendo sua volta e arrematando de forma que fique idêntica a base de uma peteca. Montados inúmeros círculos, é só uni-los de forma que os coloridos fiquem desencontrados. Quanto mais diverso, melhor. Unir lateral dos círculos. Pronto, a colcha de fuxico estará pronta! Ah, não sei se este texto permanecerá aqui...mas a saudade apertou. Difícil vai ser ir adentrando no livro e confirmando quão primitivos somos, pois na hora do aperto, não tem saco de leite de plástico que não se transforme como mágica em linda bolsa de crochê (mas esta já é outra história).

Belíssimo livro!

A
Agnaldo [Agnaldo Manuel dos Santos] 1926, Itaparica/BA - 1962, Salvador/BA
Agostinho Batista de Freitas 1927, Campinas/SP - 1997, São Paulo/SP
Alcides [Alcides Pereira dos Santos] 1932, Rui Barbosa/BA
Alcides Santos 1945, Recife/PE
Ananias Elias 1925, Varre Saia/MG
Anselmo Alves dos Santos c. 1910, São Luís de Paraitinga/SP
Antônio Leão [Antônio Bezerra Leão] 194, Tracunhaém/PE
Antônio de Oliveira 1912 - 1996, Belmiro Braga/MG
Antônio Poteiro [Antônio Batista de Souza] 1925, Santa Cristina da Posse, Braga, Portugal
Arquitetura e Espaço
Arte Pública
Arthur Bispo do Rosário 1909, Japaratuba/SE - 1989, Rio de Janeiro/RJ
Artur Pereira 1920, Cachoeira do Brumado/MG - 2003, Mariana/MG
Aurelina Batista de Almeida c.1925, Santana do Araçuaí/MG


B
Bené da Flauta de Bambu Bené of the Bamboo Flute (Benedito Pereira da Silva) c. 1922, Ouro Preto/MG - c. 1978
Benedito [Benedito José dos Santos] 1937, Maceió/AL - 1998, Recife/PE
Bigode [José Alves da Silva] 1929, Goiana/PE

C
Cardosinho [José Bernardo Cardoso júnior] 1861, Coimbra/Portugal - 1947, Rio de Janeiro/RJ
Carlos Alberto de Oliveira 1952, Novo Hamburgo/RS
Carnaval
Carrancas
Celestino [José Celestino da Silva] 1952, Juazeiro do Norte/CE
Cerâmica
Chico Silva [Francisco Domingos da Silva] 1910, Alto Tejo/AC - 1985, Fortaleza/CE
Chico Tabibuia [Francisco Moraes da Silva] 1936, Casimiro de Abreu/RJ
Ciça [Cícera Fonseca da Silva] ou Cícera Lira 1935, Juazeiro do Norte/CE
Ciça de Barro Cru [Cícera Maria de Araújo] 1920, Juazeiro do Norte/CE - 1997, Juazeiro do Norte/CE
Conceição dos Bugres [Conceição Freitas da Silva] 1914, Povinho de Santiago/RS - 1984, Campo Grande/MS
Cordel

D
Dadinho [Geraldo Marçal dos Reis] 1931, Diamantina/MG
Delmira [Delmira Ferreira de Oliveira] 1933, Padre Paraíso/MG
Dezinho de Valença [José Alves de Oliveira] 1916, Valença/PI

E
Eli Heil [Eli Malvina Heil] 1929, Palhoça/SC
Elisa [Elisa Martins da Silveira] 1912, Teresina/PI - 2001, Rio de Janeiro/RJ
Expedito [Expedito Antônio dos Santos] 1933, São Pedro/PI
Ex-Votos

F
Fernando da Ilha do Ferro [Fernando Rodrigues dos Santos]
Festas
Francisca Lopes
Francisco Araújo de Carvalho
Francisco Biquiba dy Lafuente Guarany
Futebol

G
Galdino [Manoel Galdino de Freitas]
Gentileza, Profeta Prophet Gentleness [José Datrino]
Geraldo Dantas  [de Melo]
G.T.O [Geraldo Teles de Oliveira]
Gerar [José Geraldo Machado]
Guilherme ou Gulerdúcio [José Guilherme dos Santos]

H
Heitor dos Prazeres
Hélio Melo

I
Índios
Isabel Mendes da Cunha

J
Jacinta Gomes Barbosa Xavier
Jadir João Egídio
Jorge Brito [Jorge de Oliveira Brito]
José Antônio da Silva
José Antônio Vieira [J.A.V.]
José Barbosa [José Barbosa da Silva]
José Ferreira da Silva [Zé Ferreira]
José Valentim Rosa
Julião, Família  [Julião, Family]
Júlio Martins da Silva
Justino [Justino de Paula Pires]

L
Lafaiete Rocha [Lafaiete Rocha Ribas] 1934, Lapa/PR - 2003, Lapa/PR
Laurentino [Laurentino Rosa dos Santos] 1937, Rio Branco do Sul/PR
Lídia Vieira 1911, Tracunhaém/PE - 1974, Idem
Louco [Boaventura da Silva Filho] 1932, Cachoeira/BA - 1992
Luiz Antônio [Luiz Antônio da Silva] 1935, Alto do Moura/PE
Luzia Dantas [Luzia Dantas de Araújo] 1937, São Vicente/RN

M
Madalena Santos Reinbolt 1919, Vitória da Conquista/BA 1977, Petrópolis/RJ
Manoel Josete Molina 1917, Bocaína/SP
Manuel da Marinheira [Manujel Cavalcanti Almeida] 1917, Boca da Mata/AL
Manuel Eudócio [Manuel Eudócio Rodrigues] 1931, Alto do Moura, Caruau/PE
Manuel Faria Leal 1938, Gamboa/RJ
Manuel Graciano [Manuel Graciano Cardoso] 1923, Santana do Cariri/CE
Maria Amélia [Maria Amélia da Silva] 1925, Tracunhaém/PE
Maria Auxiliadora {Maria Auxiliadora Silva] 1935, Campo Belo/MG 1974, São Paulo/SP
Marias - As Três Marias do Ceará
[Maria de Lurdes Cândido - M.L.C.J 1939, Juazeiro do Norte/CE
[Maria Cândido Monteiro - M.C.M.] 1961, ID.
[Maria do Socorro Cândido - M.S.C.] 1971, ID.
Maria Lira [Maria LirA mARQUES bORGES] 1945, Araçuaí/MG
Mestre Didi [Deoscóredes Maximiliano dos Santos] 1917, Salvador/BA
Mudinho [Manoel Ribeiro da Costa] 1906, Búzios/RJ

N
O
P
Q
R
S
T
U
V
X
Y
W
Z

Frota, Lélia Coelho, 1937- Pequeno dicionário da arte do povo brasileiro, século XX
Lélia Coelho Frota. - Rio de Janeiro : Aeroplano, 2005 440p.: il. 14 x 19cm.

Conceituação, pesquisa, iconografia e texto
Conception, research, iconography and text
Lélia Coelho Frota

Produção Editorial Editorial Production
Christine Dieguez

Versão para o inglês English translation
Elvyn Marshall

Aeroplano Editora e Consultoria Ltda
Av. Ataulfo de Paiva, 658 sala 402
Leblon - Rio de Janeiro - RJ
CEP 22 440-030
aeroplano@aeroplanoeditora.com.br
www.aeroplanoeditora.com.br

6 comentários:

  1. Muito interessante, não conhecia este trabalho. A postagem está daquelas que despertam a vontade de ter o livro!

    ResponderExcluir
  2. Kovacs,
    Belo teu interesse pela arte.
    Tem meio caminho andado quem o deseja de coração!

    ResponderExcluir
  3. Onde eu encontro este dicionário para comprar?
    http://ruteae.wordpress.com/

    ResponderExcluir
  4. Rute,
    Ganhei de presente entretanto, vejo que na saraiva tem:

    http://www.livrariasaraiva.com.br/pesquisaweb/pesquisaweb.dll/pesquisa?ORDEMN2=E&ESTRUTN1=&PALAVRASN1=PEQUENO%20DICIONARIO%20DA%20ARTE%20DO%20POVO%20BRASILEIRO

    Obrigada pela visita e somente hoje vi tua postagem.

    ResponderExcluir
  5. Olá.

    Preciso saber de um pequeno dado a respeito do livro. Nele, a Lelia Coelho Frota cita textualmente uma outra autora de nome "Ana Paula Machado Velho". Poderia me dizer, qual dos textos de VELHO a Lelia usou?

    Daniel Prado Alves

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Pág. 16:

      "Nesta abertura cabe ainda explicitar que a designação polissêmica de "popular" abrange desde a classe trabalhadora que mantém uma rede de relações via e compartilhada em seu território, no campo e na cidade, bem como um universo heterog~eneo de camadas, conforme o descrito por GILBERTO VELHO (1994), constituído de "pequenos proprietários, bóias-frias, pescadores, desempregados, semi-empregados, marginais do mercado de trabalho e de outros tipos, empregados domésticos, funcionários públicos, técnicos de nível médio, comerciários, bancários, diversos setores de camadas médias, moradores de favelas, conjuntos, subúrbio, periferia etc.".
      Por outro lado, VELHO chama a atenção para a fluidez das fronteiras entre níveis de cultura, "uma das características mais definidoras da sociedade brasileira." Assim, as culturas populares têm uma relação interativa com as elites, e a sociedade complexa "é vista por dois conjuntos culturais básicos que produzem e vivem essa relação de oposição complementar" conclui ele.
      Fica patente, igualmente, estarem os artistas constantes deste Dicionário atentos ao processo de mudança, aspirando a um projeto de trablaho que desenvolveram de modo autoral em suas criações. É ainda GILBERTO VELHO que, em Memórias, identidade e projeto (1994) chama a atenção para o "campo das possibilidades" que é bastante típico da sociedade moderno-contemporâneo, que "aparece fortemente solidário com o desenvolvimento de ideologias individualistas". Assim, partindo do chão coletivo da comunidade rural ou das pequenas cidades, à medida que se impregna de um ethos urbano - seja por migração, seja pela difusão de novos conteúdos midiáticos -, irão surgindo indivíduos que, na área da visualidade, gerarão obra de feição original, autoral, única. O indivíduo-sujeito recorre à memória para a construção de uma biografia, a fim de criar seu projeto artístico, a sua identidade social.


      Sr. Daniel, desculpa a demora, não tinha visto a tua postagem.
      Encontrei essa referência a VELHO na introdução.

      Excluir

LinkWithin

Related Posts with Thumbnails