sábado, 5 de outubro de 2013

Emily Bronte

Emily Bronte
1812 - Em 29 de dezembro o reverendo Patrick Bronte casa-se com maria Branwell.
1818 - Em 30 de julho, em Thornton, Yorkshire, nasce Emily Jane, filha do reverendo Patrick Bronte e Maria Branwell.
1820 - Em abril, a família muda-se para Haworth.
1821 - Morre Maria Branwell, a mãe.
1824 - Emily e as três irmãs mais velhas vão estudar em Cowan Bridge.
1825 - Em maio, morre a irmã Maria. No mês seguinte, Elizabeth, outra irmã.
1826 - As crianças ganham soldadinhos de chumbo de presente, ponto de partida para os relatos de Angria e Gondal.
1829 - Têm início os jornais de Angria.
1831 - Charlotte vai estudar em Roe Head.
1835 - O irmão Patrick vai estudar em Londres. Charlotte e Emily partem para Roe Head, a primeira como professora, a segunda como aluna. Nesse mesmo ano, Emily volta para Haworth.
1837 - Emily vai lecionar em Law Hill, mas volta para casa alguns meses depois.
1842 - Em fevereiro, viaja com Charlotte para Bruxelas. Em novembro, regressa à Inglaterra.
1846 - Em maio, é publicada a coletânea de poemas de Currer, Ellis e Acton Bell, respectivamente Charlotte, Emily e Anne. Os manuscritos de Agnes Grey, de Anne, e de O Morro dos Ventos Uivantes (*), de Emily, são aceitos.
1847 - Em outubro, é publicado Jane Eyre, de Charlotte. Em dezembro é publicado O Morro dos Ventos Uivantes, de Emily, e Agnes Grey, de Anne.
1848 - Em 24 de setembro, morre Patrick Branwell. Em 19 de dezembro, morre Emily Jane Bronte.

(*) O Morro dos Ventos Uivantes
Único romance de Emily Bronte, publicado em 1847 sob o pseudônimo de E. Bell, O Morro dos Ventos Uivantes é uma obra dramática em qeu, sobre uma aparente reconstrução da realidade, se superpõem as visões fantasmagóricas de um reino imaginário. A técnica de narração de Bronte gera uma tensa expectativa em torno do tema romântico. É um verdadeiro hino ao amor louco e impossível entre Heathcliff e Catharine.


No silêncio, um ou outro estalido de lenha queimando na lareira e o ruído incessante das agulhas de tricô. Emily ergue os olhos da costura, passeia-os pelas roupas não remendadas e observa o perfil de Charlotte, pequena e míope, tricotando. Desvia o olhar para Anne, calada, imersa na tarefa de pregar botões. Não são quatro horas da tarde, mas o céu está escuro. A noite desce cedo em Haworth, para as três, mas a escuridão não impede o trabalho.

As recordações afloram à cabeça de Emily.

Quando chegaram a Haworth, em 1820, eram oito, ao todo: irmã Maria, nascida em 1813, a irmão Elizabeth, que estava com cinco anos, a irmã Charlotte, de quatro anos, o irmão Patrick, de três anos, a irmão Anne, de quatro meses, o pai e a mãe. Emily estava com dois anos e não entendi bem por que o pai decidira mudar-se para um lugar tão solitário, batido pelos ventos uivantes. A partir da mudança, a família começou a diminuir. Primeiro morreu a mãe. Tia Branwell fora morar com eles. Para as crianças, as brincadeiras quase inexistiam. Por isso pensaram que faria pouca diferença ir para a escola dos filhos de clérigos, em Cowan Bridge. Enganaram-se. Se em casa viviam vigiados e reprimidos, tinham ao menos comida e conforto. No internato, sofriam castigos, alimentavam-se mal e não dormiam de frio. Quando Emily foi para a escola, encontrou Maria, a irmã mais velha, tossindo incessantemente e queixando-se de fortes dores no peito. Num dia de fevereiro, viu-a ser mandada às pressas para casa, onde morreu três meses depois. Elizabeth, a segunda, também acabou sucumbindo às condições do internato e faleceu no verão.

O reverendo Bronte tirou os demais filhos do colégio e levou-os de volta para Haworth. Em casa, encontraram uma agradável surpresa: a presença da nova empregada Thabitha - Taby, como a chamavam -, cuja alegria e cujas histórias ajudavam a amenizar a austeridade imposta pela tia e pelo pai. Afeiçoaram-se de tal modo a ela que, anos mais tarde, quando Taby se tornou mais morosa no desempenho de suas tarefas, em consequência de um acidente, Emily saiu de seu silêncio para impedir que o pai a despedisse. Posteriormente, imortalizou-a como a fiel Nelly Dean, em O Morro dos Ventos Uivantes.

Contente por ter quem a ajudasse nos serviços caseiros, a tia abrandou a vigilância às poucas brincadeiras das crianças. Desde que não fizessem barulho nem desordem, podiam dispor de seu tempo livre como quisessem. Geralmente reuniam-se no quarto grande e liam alto os contos de As Mil e Uma Noites, revistas presbiterianas, jornais e peças de Shakespeare.

Um dia, o pai viajara para Leeds e retornara trazendo um presente para Patrick. As crianças se aglomeraram em volta da caixa de madeira, respiração suspensa, à espera do conteúdo. Patrick então levantou a tampa e foi tirando, um por um, doze soldadinhos de chumbo. Charlotte, por ser a mais velha, escolheu primeiro o que lhe pareceu mais bonito, e batizou-o "Duque de Wellington". Depois Emily tomou o soldadinho que julgou mais parecido com ela mesma - tristonho e sério -, e deu-lhe o nome de "Gravey". Anne escolheu por último - o "mensageiro". Patrick guardou os restantes, declarando que todos poderiam brincar. Em Haworth, ninguém dormiu, procurando um tema para a nova brincadeira. Lembraram-se das histórias que haviam lido, dos relatos da Taby, com quem passavam tardes inteiras conversando na cozinha.

Inventaram epopéias, tramaram enredos e, um dia, resolveram escrevê-los. Patrick sugeriu que registrassem as histórias em forma de jornal. Ele cortava as páginas, do tamanho dos soldadinhos, e Charlotte desenhava as letras, que mais se pareciam com caracteres de imprensa, de tão iguais e miúdas que eram. Emily e Anne, sentindo-se rejeitadas porque os irmãos não aproveitaram nenhuma de suas sugestões, decidiram criar separadamente suas próprias histórias, situando-as na ilha imaginária de Gondal, no Pacífico. Como testemunho desse tempo feliz, restou somente cerca de uma centena de pequenos jornais de Angria e uma ou outra página dos relatos de Gondal - ponto de partida de três carreiras literárias.

Alguns anos mas tarde, Charlotte entrou para o colégio em Roe Head. Patrick, em vez de estudar desenho em Londres, para onde o pai o enviara, acreditando em seu talento, começara a beber desmedidamente. Emily, a essa altura, já se voltara para dentro de si, disfarçando com uma máscara de indiferença as emoções que a sacudiam. O tempo passou entre estudos e os relatos de Taby.
Charlotte concluíra o colégio e voltara para casa, mas os professores gostaram tanto dela e de seu talento que a convidaram para lecionar com eles em Roe Head. Charlotte aceitou o convite e levou Emily consigo.

Entre as companheiras tagarelas e vivas, a irmã mais nova sentia-se uma estrangeira. Não conseguia participar das confidências, não suspirava por nenhum rapaz, não sonhava com vestidos da moda. Cumpria os deveres, como estava habituada, compunha alguns poemas e, sozinha em seu quarto, chorava de saudade do cão Tiger. Charlotte percebeu que Emily ia definhando, e chegou a temer que morresse, caso não voltasse a tempo para Haworth. Mandou-a de volta. Ao chegar em casa, Emily encontrou Patrick cada vez mais se consumindo na bebida, e Anne pronta para ir ocupar seu lugar em Roe Head. Mas sentia-se melhor. Tinha outra vez para si o uivo dos ventos e os toques do sino. No casarão vazio desempenhava mudamente suas tarefas. Jamais se queixava de coisa alguma, nem da mordida que um cão supostamente raivoso lhe dera no braço. Ela mesma cauterizara o ferimento e, em consequência da queimadura, ficara com o braço deformado. Ninguém teria sabido, se Charlotte, meses depois, não insistisse em perguntar por que andava com roupas de mangas compridas em pleno verão.

Nos intervalos dos afazeres domésticos, compunha poemas que escondia, e lia livros e as cartas de Chalotte em que esta confessava suas decepções e amarguras. Por meio da correspondência, Emily ficou sabendo que o irmã enviara alguns versos aos poetas Wordworth e Southey, e estava muito aborrecida com o parecer desanimador de ambos. Censurava-a também por não ter conseguido vencer a timidez. Foi por isso que Emily resolveu empenhar-se numa segunda tentativa de ajustamento ao mundo e aceitou um ugar de professora numa escola em Law Hill, próxima a Haworth. Apesar de seus esforços, fracassou novamente. O trabalho não constituíra a principal razão de sua desistência, pois estava habituada a serviços pesados. A timidez, o mutismo, a impossibilidade de se comunicar com as pessoas é que a levaram outra vez de volta para casa.

Charlotte era a mais que tinha mais iniciativa de todos os irmãos. E decidiu abrir uma escola perto de Haworth.

Como precisava aperfeiçoar-se em línguas estrangeiras e tinha algumas amigas em Bruxelas, decidiu partir e levar também Emily.

No dia em que embarcaram para a Bélgica nevava muito. Com um empréstimo cedido pela tia, as duas moças viajaram acompanhadas do pai, que, deixando-as num pensionato feminino, retornou ao presbitério.

Emily não conseguira entender por que antipatizara com o professor Héger. Cumpria os deveres, estudava com esforço, mas encolhia-se quando era obrigada a falar com ele. Charlotte não compartilhava a opinião da irmão acerca do professor. Parecia, ao contrário, procurar ocasião para conversar com ele ou simplesmente observá-lo ao trabalho. Resolveu até permanecer em Bruxelas além do prazo estabelecido no princípio da viagem, dando aulas de inglês em troca de estudo e sustento. Emily intuía vagamente que um afeto mais profundo estava nascendo entre Charlotte e Héger. Mas ele era casado.

Os planos de Charlotte em permanecer perto do professor não se concretizaram: em novembro de 1842 as duas moças receberam uma carta do pai, chamando-as urgentemente. A tia havia falecido.
taby estava doente, a casa precisava de cuidados. Para Emily, que estava com 24 anos, a dor causada pela morte da tia era compensada pela alegria de se reencontrar com a natureza. O mesmo não aconteceu com Charlotte, que, alguns meses depois, retornou a Bruxelas, alegando que não podia deixar inacabado o trabalho que iniciara. Pelas cartas, Emily compreendeu que a irmão não era feliz na Bélgica. A esposa do professor percebera o afeto entre o marido e a jovem e usava de mil artifícios para separá-los. Magoada e desiludida, Charlotte regressou a Haworth no final de 1843.

Como o dinheiro era escasso e eles precisavam sobreviver, as irmãs decidiram abrir uma escola. Fizeram planos, programas, horários, mas não encontraram alunos. Emily convenceu-se de que ninguém matricularia os filhos por causa da reputação de Patrick, mas não ousou dizer nada. Jamais acusara alguém, muito menos o irmão, cujos defeitos ela desculpava e encobria. Nunca teve uma palavra áspera para com ele, nem na noite terrível em que Patrick, bêbado, tentara matar o reverendo. As irmãs presenciaram a cena pálidas de susto, mas Emily se colocara entre ambos. Usara de toda a sua força moral e física para evitar o crime.

Muitas das brigas descritas em O Morro dos Ventos Uivantes são reconstituições desse e de outros tristes espetáculos.

Engavetado o projeto da escola, Anne e Patrick foram trabalhar como preceptores das crianças de uma abastada família, e Emily ficou em Haworth com Charlotte. Sozinhas em casa, as duas conversaram o dia inteiro, trabalhavam juntas, escreviam. Acalentaram até a esperança de revive os tempos de Angria, quando Anne e Patrick retornassem no ano seguinte. Mas a razão de seu regresso era tão triste que qualquer possibilidade de recuperar a felicidade caiu por terra. Patrick fora despedido por andar de amores com a esposa de seu patrão e bebia mais que do antes.

Um dia Charlotte descobriu os poemas ocultos de Emily e pediu-lhes permissão para publicá-los, juntamente com os seus e os de Anne. Emily a princípio recusou, mas acabou vencida pela argumentação de que aquele seria um meio de ganhar o dinheiro que tanta falta lhes fazia. Se os versos fossem aceitos, teriam o caminho aberto para a publicação de um romance em fascículos, como era moda, e garantiriam sua subsistência. Além do mais, Charlotte assegurou-lhe que usariam pseudônimo.

Em janeiro de 1846, uma pequena editora da província resolveu publicar o livro por conta das próprias autoras, que, para isso, empregariam a herança deixada pela tia. Poucos exemplares foram vendido, mas a crítica elogiou o trabalho e prognosticou um grande futuro para Ellis Bell, pseudônimo de Emily Bronte. O fracasso dos poemas naquela época não fez as três irmãs abandonarem a idéia de escrever um romance. Desde os relatos da Angria, sentiam que era importante escrever. Cada qual começou a compor sua narrativa. Enquanto a irmã mais velha trabalhava em O Professor, tanto libertar-se da mágoa pelo amor frustrado em Bruxelas, Anne lembrava passagens da infância em Agnes Grey, e Emily narrava com cores sombrias a atmosfera de Haworth em O Morro dos Ventos Uivantes. Concluíram suas obras quase simultaneamente e mandaram-nas para o mesmo editor, que recusou apenas o romance de Charlotte.

No entanto, esta acabou conquistando a fama antes das outras. O pai convalescia de uma operação da vista. Patrick continuava sua vida desregrada, Emily e Anne cuidavam da casa e Charlotte, à cabeceira do reverendo, recordava-se a si mesma em Jane Eyre. Publicado no ano seguinte, assinado com o pseudônimo de Currer Bell, o romance atingiu enorme sucesso. As revistas especializadas não se cansaram de louvar o talento do autor. Os leitores chegaram a solicitar à editora que revelassem quem era ao romancista. O pai, quando soube, experimentou uma alegria que nunca sentira. A história melodramática e simples fez chorar muita gente na Inglaterra.

Quando foi lançado O Morro dos Ventos Uivantes, em 1846, sob o pseudônimo de Ellis Bell, Emily contava 28 anos. O romance de Charlotte encontrava-se na segunda edição. Os leitores, que haviam vibrado com as desventuras de Jane Eyre, não podiam compreender a violência da obra de Emily, posteriormente considerada a mais talentosa das irmãs Bronte e uma das maiores romancistas da literatura universal.

Emily sacode a cabeça como que tentando livrar-se das lembranças do passado. Ela está com trinta naos, mas sente-se extremamente cansada e deprimida. Era tarde para reavivar os sonhos antigos. Nunca poderiam coltar aos dias de Angria. Patrick morrera havia três meses, embrigado, aos 31 anos. Anne definha dia a dia. Para Emily, a vida não tem mais sentido. Havia semanas que uma febre não a deixava. Quase não tem forças para cuidar da casa. Charlotte desconfia de seus males, pede-lhe que se deixe examinar pelo médico. Ela se recusa: não quer provocar compaixão nem inspirar cuidados. Sabe que a qualquer momento cairá para sempre. Não acredita em sua obra. Parece-lhe que jamais poderá revelar seu mundo interior, suas esperanças não alcançadas.

Cansada de tantas recordações, Emily Bronte lentamente se levanta de sua cadeira, acaricia com o olhar os cabelos opacos das irmãs, sente vontade de fazer um gesto de carinho, e, no entanto, teme parecer ridícula. Ao erguer-se, esbarra na caixa de costura, que cai no tapete, esparramando carretéis e tesouras, dedais e botões. Em silêncio, abaixa-se para apanhá-los e descobre entre eles um soldadinho de baioneta quebrada e pintura gasta. Enquanto sobe os degraus para dirigir-se ao seu quarto, deixa rolar uma lágrima amarga e solitária pelo último dos heróis de chumbo: era 19 de setembro de 1848, duas horas da tarde. Ela deixa o mundo da mesma maneira que viveu: em silêncio, introspectiva, com sentimentos borbulhando no peito, o coração comprimido pelas emoções, mas sem conseguir externá-las. Se não fosse por O Morro dos Ventos Uivantes, ninguém saberia que alma inquieta existiu dentro de um corpo frágil e de um espírito iluminado!

Fonte: coleção obras-primas - grandes autores - vida e obra.

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