Machado de Assis |
1851 - Machado de Assis fica órfão de pai.
1855 - Trabalha como aprendiz de tipógrafo na firma de Francisco de Paula Brito. Publica o primeiro poema: Meu Anjo.
1856 - Trabalha na Imprensa Nacional.
1858 - Trabalha como revisor de provas na casa Francisco de Paula Briot. Publica o primeiro ensaio crítico: O Passado, o Presente e o Futuro da Literatura.
1860 - É contratado como redator no Diário do Rio de Janeiro.
1861 - Estréia como comediógrafo: Hoje Avental, Amanhã Luva.
1864 - Publica Crisálidas, primeira coletânea poética.
1867 - Conhece Carolina Augusta Xavier de Novais. Trabalha no Diário Oficial.
1869 - Casa-se com Carolina Augusta.
1870 - Publica Contos Fluminenses e Falenas.
1872 - Publica Ressurreição.
1873 - Publica Histórias da Meia-Noite.
1874 - Publica A Mão e a Luva.
1876 - Publica Helena.
1878 - Publica Iaiá Garcia. Parte para um retiro em Nova Friburgo.
1881 - Publica Memórias Póstumas de Brás Cubas.
1891 - Publica Quincas Borba.
1897 - Preside a sessão de abertura da Academia Brasileira de Letras. É demitido da Secretaria da Indústria.
1898 - Volta a trabalhar como secretário do ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas.
1900 - Publica Dom Casmurro.
1904 - Publica Esaú e Jacó (*). No dia 20 de outubro, Carolina morre.
1908 - Em maio ausenta-se do ministério, doente. Em julho publica Memorial de Aires (*). No dia 29 de setembro, morre.
(*) Esaú e Jacó - Memorial de Aires
Machado explora, em Esaú e Jacó, o conflito das relações entre os gêmeos Pedro e Paulo com a jovem Flora, que nutre diferentes sentimentos de afeto por um e por outro.
Último romance de Machado, Memorial de Aires é a história de dois idílios: o do casal Aguiar e o da viúva Fidélia com Tristão. Obra intimista, é narrada pelo conselheiro Aires, personagem também presente em Esaú e Jacó.
Daqui a pouco será crepúsculo. O sol, em fins de tarde de outubro, estará brilhando morno sobre o Rio de Janeiro. Irá bater com sua luz nas janelas fechadas de um prédio antigo, no Cosme Velho. Ninguém o atenderá, porque o dono da casa, viúvo e solitário, terá saído para um último passeio e não vai voltar.
Machado morre de madrugada, após cinco meses de dores e quatro anos de solidão. Perguntam-lhe se não quer fazer vir um padre. E ele, que não entra na igreja desde o dia de seu casamento, responde a custo, pois que a língua ulcerada lhe dói e pesa na boca:" Não. Isso seria uma hipocrisia". É 29 de setembro. 1908. Faltam quinze minutos para as 4 da manhã.
O dia se faz. As cores transbordam, luminosas. As ruas se povoam. Em frente à casa do Cosme Velho, movimento de carros e pessoas, médicos, agentes funerários, empregados federais. Antes de escurecer, o morto deve estar pronto para ser velado no salão da Academia Brasileira de Letras.
A brisa de junho sopra fria no Morro do Livramento, naquele dia de 1839. Maria Leopoldina, lavadeira de profissão, começa a recolher as roupas do varal, quando as dores levam-na ao leito. A casinha pobre ganha um novo habitante: Joaquim Maria Machado de Assis. Joaquim, em homenagem ao padrinho. Maria, por causa da madrinha, dona da Chácara do Livramento. Machado, que é o sobrenome dos avós maternos. Assis, o nome do pai.
Os anos correm depressa no Morro do Livramento. Joaquim vai vivendo um pouco no casarão da madrinha, ouvindo descrições de festas aristocráticas narradas pelas senhoras que chegam de saias farfalhantes, outro pouco na casinha dos pais, conversando com Francisco sobre histórias de almanaque ou escutando a mãe contar-lhe passagens da infância em Portugal. Depois de nascida a irmã, as conversas com a mãe vão ficando raras. A solidão ganha um peso maior para aquele menino gago e tímido.
Num curto espaço de tempo, morrem-lhe a mãe e a irmã A madrinha serve-lhe de esteio. Depois ganha uma madrasta: Maria Inês, mulata meiga e delicada, que sabe ler e cozinha com perfeição. Transmite ao pequeno todos os seus conhecimentos. Quando esgotados, sugere ao marido que coloque o menino na escola.
Em 1851, morre-lhe o pai. Maria Inês emprega-se como cozinheira no Colégio de São Cristóvão. Nas oras vagas faz balas, que o menino vende na rua. Um dia ele vai à padaria da sra. Gallot. Ela e se empregado, ambos franceses, gostam do pequeno e lhe ensinam seu idioma. Mais tarde, valendo-se desse aprendizado, traduziria o ensaio Literatura perante a Restauração, de Lamartine, o romance Os Trabalhadores do Mar, de Victor Hugo, e várias outras obras da literatura francesa.
Vender doces na rua não condiz nem com a timidez nem com a fragilidade de Joaquim Maria. A madastra encontra-lhe outro emprego, parece que de "sacristia" ou coroinha na igreja da Lampadosa - os biógrafos não conseguiram apurar com segurança. O certo é que, por volta dos quinze anos, tem um emprego, e, nas horas de folga, passeia pela cidade, demorando-se no Largo do Rossio, a espiar as vitrinas de livros. A livraria e tipografia de Francisco de Paula Brito é o que o atrai de modo especial, não tanto pelos livros expostos mas pelas discussões que ali são travadas. Um dia o dono da loja o vê, hesitante na soleira, e o anima a entrar. Dá-lhe um emprego de aprendiz de tipógrafo e a oportunidade de estrear como poeta, publicando, em seu jornal A Marmota, os primeiros versos de amor do jovem amigo: Meu Anjo.
Passado algum tempo, o trabalho na oficina do Largo do Rossio não tem mais mistérios; Machado quer subir mais um degrau. Em 1856, deixa Paula Brito e emprega-se na Imprensa Nacional, ainda na condição de aprendiz de tipógrafo, porém com a esperança de melhor futuro.
Essa esperança fica abalada quando o diretor do jornal, Manoel Antônio de Almeida, o chama para passar-lhe uma reprimenda. Machado fora surpreendido lendo durante o expediente. Todavia, o sermão não chega a ser rude. Almeida, que garantiria a imortalidade com o romance Memórias de um Sargento de Milícias, compreende a sede intelectual do funcionário, percebe-lhe a sensibilidade. Torna-se seu amigo e, sem o saber, seu discípulo.
Baseado nos diálogos literários com Manuel Antônio Almeida, nos debates do círculo de A Marmota, que ele continua a frequentar, e nas aulas de gramática e conhecimentos gerais com o Padre Silveira Sarmento, em 1858 Machado publica o ensaio O Passado, o Presente e o Futuro da Literatura, marco inicial de uma atividade crítica que prologaria até 1879 e se pautaria sempre pelo bom gosto, pela honestidade, pela agudez da análise.
Ainda em 1858, Machado começa a colaborar no Paraíba, jornal de Petrópolis, e volta à firma Paula Brito na função de revisor de provas. Havia subido um degrau.
Em 1859 passa para o Correio Mercantil, em igual função. Ao sair pela segunda vez da casa Paula Brito, não deixa, porém, o convívio do A Marmota, onde é sempre recebido com estímulo e afeto. Com Eleutério de Sousa funda, no mesmo ano a revista Espelho, na qual começa sua brilhante carreira de cronista, registrada em vários periódicos do Rio de Janeiro.
Em 1860 consegue uma vaga de redator no Diário do Rio de Janeiro. Escrever em um jornal conceituado, dirigido a um público exigente, obriga-o a dar um tratamento cuidadoso e perspicaz aos fatos, força-o a apurar o estilo. À estréia do cronista segue-se a do comediógrafo. Em 1861 apresenta duas peças medíocres: Hoje Avental, Amanhã Luva e Desencantos. A última representa a aplicação de uma teoria enunciada no opúsculo Queda que as Mulheres Têm para os Tolos, também de 1861, segundo a qual os tolos vençam na vida, enquanto os talentosos fracassam. Mais tarde, retoma o tema em Memórias Póstumas de Brás Cubas e desenvolve-o no conto Teoria do Medalhão.
O teatro machadiano, que compreende treze peças, na maioria escritas no período de 1861 a 1866, é encarado como a parte mais fraca de sua produção literária. Assim como a poesia, constitui uma espécie de exercício, uma busca da forma mais adequada à expressão de seu pensamento.
É desse período a publicação, no Diário do Rio de Janeiro, da tradução de Os Trabalhadores do Mar, de Victor Hugo, apresentada pelo próprio Machado com a nota de 15 de março de 1866: "Começamos hoje a publicação do romance de Victor Hugo Os Trabalhadores do Mar, há tanto tempo anunciado na imprensa européia e ansiosamente esperado pelos admiradores do grande poeta".
Entre a publicação de Crisálidas, em 1864, e o sucesso da tradução de Os Trabalhadores do Mar, em 1866, Machado vai levando a vida.
No ano seguinte conhece Carolina Augusta Xavier de Novais, cuja mãe morrera em Portugal. Carolina viera, junto com os irmãos Adelaide e Miguel, unir-se a Faustino, o outro irmão, poeta que vive no Rio de Janeiro. Está longe de ser bela. O rosto severo ostante as marcas dos 23 anos vazios de amor. Dedicara a vida à família e à leitura. Conhece bem os clássicos portugueses, é versada em gramática. De índole afetuosa, recatada e doce, cativa a todos os que a conhecem. Cativa Machado também.
Em princípios de 1867, os dois solitários se encontram junto à cabeceira de Faustino, que luta contra uma enfermidade. Encontram-se e amam-se. Assessor de diretoria no Diário Oficial, Machado, além do ordenado ganha com as colaborações para vários periódicos. Tem talento, educação e um belo futuro. Mesmo assim, Adelaide e Miguel se opõem: não querem um mulato na família. Mas o obstáculo é vencido, e eles se casam em 12 de novembro de 1869.
"A pobreza foi o lote dos primeiros tempos de casados", informa o Memorial de Aires (1908). Os proventos do marido são suficientes apenas para o necessário; nenhum luxo. Os ataques epilépticos voltam. Carolina tenta minorar-lhe o sofrimento. Lê e revisa-lhe os manuscritos, corrigindo os possíveis deslizes gramaticais, sugerindo modificações. As primeiras obras revisadas por ela constituem a estréia de Machado em dois gêneros que ele maneja com maestria: o conto e o romance. No ano seguinte ao casamento, Machado publica Contos Fluminenses, seguidos do romance Ressurreição (1872) e de Histórias da Meia-Noite (1873). Juntamente com os romances A Mão e a luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878), esses trabalhos constituem a chamada "fase inicial" de Machado, já revelando seu talento de narrador. Nos três últimos romances há um forte toque autobiográfico. Todos eles giram basicamente em torno dos mesmos temas: ambição e orgulho, o drama íntimo de Machado com relação à madrasta. Em 1860 ele se mudara de São Cristóvão para o centro, afastando-se cada vez mais de Maria Inês, a ponto de ela ter de recorrer à caridade alheia para sobreviver. Em 1874 a mulata morre. Ferido na consciência, o enteado procura desabafar, projetando-se em seus personagens.
Em fins de 1878 Machado, acompanhado de Carolina, parte para nova Friburgo, por recomendação médica. A estada em Friburgo o faz rever certos valores e posições e enveredar por novos caminhos. De volta ao Rio de Janeiro, Machado inicia a elaboração de Memórias Póstumas de Brás Cubas, publicado primeiro em folhetim, depois pela Garnier, em 1881.
Em 1882 publica o conto O Alienista, sátira mais feroz que a de Brás Cubas. O protagonista do conto, ao perceber a falência de seu raciocínio, incapaz de distinguir entre loucos e sãos, recolhe-se ao hospício e suicida-se mentalmente.
A loucura é um dos temas constantes na obra machadiana, ao lado dos problemas da dúvida (Esaú e Jacó), do bem e do mal (Singular Ocorrência), da ânsia da perfeição (Trio em Lá Menor, Cantiga de Esponsais) da autodefinição da personalidade (O Espelho), do despertar dos instintos na adolescência (Missa do Galo), tratados nos contos e nos romances da maturidade.
Escrevendo sobre adultério, morte, sadismo, alienação, Machado não se demora em cenas chocantes. A sobriedade e a sutileza são características suas, numa época em que os realistas se desdobram em detalhes grosseiros. Ele prefere sugerir a declarar.
Ao contrário de Brás Cubas, Machado conquista a glória e o amor, tem amigos e discípulos, e só lamenta não ter filhos - porque teme transmitir não "o legado da nossa miséria", mas a tragédia de sua doença, que o carinho de Carolina ajuda a suportar.
Leva uma vida calma, perturbada apenas pelos ataques epilépticos.
Em abril de 1897 Machado conduz a sessão inaugural da Academia Brasileira de Letras. Pena que a alegria desse momento seja empanada pela demissão de Machado. O governo decide confiar a direção da Secretaria a um técnico. O escritor fica inativo por quase um ano, até que, em novembro de 1898, é reincorporado como secretário do ministro da Viação.
A volta ao trabalho restitui-lhe a calma necessária para compor Dom Casmurro (1900), o mais pessoal de seus romances, uma análise profunda do ciúme.
Carolina ainda revisa o manuscrito de Dom Casmurro, mas não pode ler Esaú e Jacó. Está doente. Procura esconder do marido as dores de estômago, agravadas por uma receita errada fornecida pelo farmacêutico. Em fins de 1903, não pode continuar ocultando. Ao começar o ano-novo, o casal parte para Nova Friburgo, na esperança da cura. Ali ficam um mês, ela esforçando-se por parecer melhor, ele esmerando-se por parecer confiante. Ambos sabendo que não haveria mais tempo. Em 20 de outubro de 1904, à beira do 35. aniversário de um casamento tranquilo, Carolina morre.
A maneira que Machado tem de falar na mulher sem cansar os amigos nem desvelar sua intimidade é contar episódios da vida conjugal como se fossem coisas de ficção. A idéia tarda em criar corpo. Só em 1907, entre estudos de grego e expedientes no Ministério da Viação, onde era diretor geral de contabilidade desde 1902, ele começa a escrever Memorial de Aires. Um relato de ancião, a passo lento. Quadros da vida de Carmo e Aguiar (na verdade Machado e Carolina). Percalços da aventura amorosa de Fidélia e Tristão. E um final feliz. A vida é pacata, mas sorri. E o velho Machado faz as pazes com ela, um pouco antes de se despedir.
Fonte: coleção obras-primas - grandes autores - vida e obra.
Num curto espaço de tempo, morrem-lhe a mãe e a irmã A madrinha serve-lhe de esteio. Depois ganha uma madrasta: Maria Inês, mulata meiga e delicada, que sabe ler e cozinha com perfeição. Transmite ao pequeno todos os seus conhecimentos. Quando esgotados, sugere ao marido que coloque o menino na escola.
Em 1851, morre-lhe o pai. Maria Inês emprega-se como cozinheira no Colégio de São Cristóvão. Nas oras vagas faz balas, que o menino vende na rua. Um dia ele vai à padaria da sra. Gallot. Ela e se empregado, ambos franceses, gostam do pequeno e lhe ensinam seu idioma. Mais tarde, valendo-se desse aprendizado, traduziria o ensaio Literatura perante a Restauração, de Lamartine, o romance Os Trabalhadores do Mar, de Victor Hugo, e várias outras obras da literatura francesa.
Vender doces na rua não condiz nem com a timidez nem com a fragilidade de Joaquim Maria. A madastra encontra-lhe outro emprego, parece que de "sacristia" ou coroinha na igreja da Lampadosa - os biógrafos não conseguiram apurar com segurança. O certo é que, por volta dos quinze anos, tem um emprego, e, nas horas de folga, passeia pela cidade, demorando-se no Largo do Rossio, a espiar as vitrinas de livros. A livraria e tipografia de Francisco de Paula Brito é o que o atrai de modo especial, não tanto pelos livros expostos mas pelas discussões que ali são travadas. Um dia o dono da loja o vê, hesitante na soleira, e o anima a entrar. Dá-lhe um emprego de aprendiz de tipógrafo e a oportunidade de estrear como poeta, publicando, em seu jornal A Marmota, os primeiros versos de amor do jovem amigo: Meu Anjo.
Passado algum tempo, o trabalho na oficina do Largo do Rossio não tem mais mistérios; Machado quer subir mais um degrau. Em 1856, deixa Paula Brito e emprega-se na Imprensa Nacional, ainda na condição de aprendiz de tipógrafo, porém com a esperança de melhor futuro.
Essa esperança fica abalada quando o diretor do jornal, Manoel Antônio de Almeida, o chama para passar-lhe uma reprimenda. Machado fora surpreendido lendo durante o expediente. Todavia, o sermão não chega a ser rude. Almeida, que garantiria a imortalidade com o romance Memórias de um Sargento de Milícias, compreende a sede intelectual do funcionário, percebe-lhe a sensibilidade. Torna-se seu amigo e, sem o saber, seu discípulo.
Baseado nos diálogos literários com Manuel Antônio Almeida, nos debates do círculo de A Marmota, que ele continua a frequentar, e nas aulas de gramática e conhecimentos gerais com o Padre Silveira Sarmento, em 1858 Machado publica o ensaio O Passado, o Presente e o Futuro da Literatura, marco inicial de uma atividade crítica que prologaria até 1879 e se pautaria sempre pelo bom gosto, pela honestidade, pela agudez da análise.
Ainda em 1858, Machado começa a colaborar no Paraíba, jornal de Petrópolis, e volta à firma Paula Brito na função de revisor de provas. Havia subido um degrau.
Em 1859 passa para o Correio Mercantil, em igual função. Ao sair pela segunda vez da casa Paula Brito, não deixa, porém, o convívio do A Marmota, onde é sempre recebido com estímulo e afeto. Com Eleutério de Sousa funda, no mesmo ano a revista Espelho, na qual começa sua brilhante carreira de cronista, registrada em vários periódicos do Rio de Janeiro.
Em 1860 consegue uma vaga de redator no Diário do Rio de Janeiro. Escrever em um jornal conceituado, dirigido a um público exigente, obriga-o a dar um tratamento cuidadoso e perspicaz aos fatos, força-o a apurar o estilo. À estréia do cronista segue-se a do comediógrafo. Em 1861 apresenta duas peças medíocres: Hoje Avental, Amanhã Luva e Desencantos. A última representa a aplicação de uma teoria enunciada no opúsculo Queda que as Mulheres Têm para os Tolos, também de 1861, segundo a qual os tolos vençam na vida, enquanto os talentosos fracassam. Mais tarde, retoma o tema em Memórias Póstumas de Brás Cubas e desenvolve-o no conto Teoria do Medalhão.
O teatro machadiano, que compreende treze peças, na maioria escritas no período de 1861 a 1866, é encarado como a parte mais fraca de sua produção literária. Assim como a poesia, constitui uma espécie de exercício, uma busca da forma mais adequada à expressão de seu pensamento.
É desse período a publicação, no Diário do Rio de Janeiro, da tradução de Os Trabalhadores do Mar, de Victor Hugo, apresentada pelo próprio Machado com a nota de 15 de março de 1866: "Começamos hoje a publicação do romance de Victor Hugo Os Trabalhadores do Mar, há tanto tempo anunciado na imprensa européia e ansiosamente esperado pelos admiradores do grande poeta".
Entre a publicação de Crisálidas, em 1864, e o sucesso da tradução de Os Trabalhadores do Mar, em 1866, Machado vai levando a vida.
No ano seguinte conhece Carolina Augusta Xavier de Novais, cuja mãe morrera em Portugal. Carolina viera, junto com os irmãos Adelaide e Miguel, unir-se a Faustino, o outro irmão, poeta que vive no Rio de Janeiro. Está longe de ser bela. O rosto severo ostante as marcas dos 23 anos vazios de amor. Dedicara a vida à família e à leitura. Conhece bem os clássicos portugueses, é versada em gramática. De índole afetuosa, recatada e doce, cativa a todos os que a conhecem. Cativa Machado também.
Em princípios de 1867, os dois solitários se encontram junto à cabeceira de Faustino, que luta contra uma enfermidade. Encontram-se e amam-se. Assessor de diretoria no Diário Oficial, Machado, além do ordenado ganha com as colaborações para vários periódicos. Tem talento, educação e um belo futuro. Mesmo assim, Adelaide e Miguel se opõem: não querem um mulato na família. Mas o obstáculo é vencido, e eles se casam em 12 de novembro de 1869.
"A pobreza foi o lote dos primeiros tempos de casados", informa o Memorial de Aires (1908). Os proventos do marido são suficientes apenas para o necessário; nenhum luxo. Os ataques epilépticos voltam. Carolina tenta minorar-lhe o sofrimento. Lê e revisa-lhe os manuscritos, corrigindo os possíveis deslizes gramaticais, sugerindo modificações. As primeiras obras revisadas por ela constituem a estréia de Machado em dois gêneros que ele maneja com maestria: o conto e o romance. No ano seguinte ao casamento, Machado publica Contos Fluminenses, seguidos do romance Ressurreição (1872) e de Histórias da Meia-Noite (1873). Juntamente com os romances A Mão e a luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878), esses trabalhos constituem a chamada "fase inicial" de Machado, já revelando seu talento de narrador. Nos três últimos romances há um forte toque autobiográfico. Todos eles giram basicamente em torno dos mesmos temas: ambição e orgulho, o drama íntimo de Machado com relação à madrasta. Em 1860 ele se mudara de São Cristóvão para o centro, afastando-se cada vez mais de Maria Inês, a ponto de ela ter de recorrer à caridade alheia para sobreviver. Em 1874 a mulata morre. Ferido na consciência, o enteado procura desabafar, projetando-se em seus personagens.
Em fins de 1878 Machado, acompanhado de Carolina, parte para nova Friburgo, por recomendação médica. A estada em Friburgo o faz rever certos valores e posições e enveredar por novos caminhos. De volta ao Rio de Janeiro, Machado inicia a elaboração de Memórias Póstumas de Brás Cubas, publicado primeiro em folhetim, depois pela Garnier, em 1881.
Em 1882 publica o conto O Alienista, sátira mais feroz que a de Brás Cubas. O protagonista do conto, ao perceber a falência de seu raciocínio, incapaz de distinguir entre loucos e sãos, recolhe-se ao hospício e suicida-se mentalmente.
A loucura é um dos temas constantes na obra machadiana, ao lado dos problemas da dúvida (Esaú e Jacó), do bem e do mal (Singular Ocorrência), da ânsia da perfeição (Trio em Lá Menor, Cantiga de Esponsais) da autodefinição da personalidade (O Espelho), do despertar dos instintos na adolescência (Missa do Galo), tratados nos contos e nos romances da maturidade.
Escrevendo sobre adultério, morte, sadismo, alienação, Machado não se demora em cenas chocantes. A sobriedade e a sutileza são características suas, numa época em que os realistas se desdobram em detalhes grosseiros. Ele prefere sugerir a declarar.
Ao contrário de Brás Cubas, Machado conquista a glória e o amor, tem amigos e discípulos, e só lamenta não ter filhos - porque teme transmitir não "o legado da nossa miséria", mas a tragédia de sua doença, que o carinho de Carolina ajuda a suportar.
Leva uma vida calma, perturbada apenas pelos ataques epilépticos.
Em abril de 1897 Machado conduz a sessão inaugural da Academia Brasileira de Letras. Pena que a alegria desse momento seja empanada pela demissão de Machado. O governo decide confiar a direção da Secretaria a um técnico. O escritor fica inativo por quase um ano, até que, em novembro de 1898, é reincorporado como secretário do ministro da Viação.
A volta ao trabalho restitui-lhe a calma necessária para compor Dom Casmurro (1900), o mais pessoal de seus romances, uma análise profunda do ciúme.
Carolina ainda revisa o manuscrito de Dom Casmurro, mas não pode ler Esaú e Jacó. Está doente. Procura esconder do marido as dores de estômago, agravadas por uma receita errada fornecida pelo farmacêutico. Em fins de 1903, não pode continuar ocultando. Ao começar o ano-novo, o casal parte para Nova Friburgo, na esperança da cura. Ali ficam um mês, ela esforçando-se por parecer melhor, ele esmerando-se por parecer confiante. Ambos sabendo que não haveria mais tempo. Em 20 de outubro de 1904, à beira do 35. aniversário de um casamento tranquilo, Carolina morre.
A maneira que Machado tem de falar na mulher sem cansar os amigos nem desvelar sua intimidade é contar episódios da vida conjugal como se fossem coisas de ficção. A idéia tarda em criar corpo. Só em 1907, entre estudos de grego e expedientes no Ministério da Viação, onde era diretor geral de contabilidade desde 1902, ele começa a escrever Memorial de Aires. Um relato de ancião, a passo lento. Quadros da vida de Carmo e Aguiar (na verdade Machado e Carolina). Percalços da aventura amorosa de Fidélia e Tristão. E um final feliz. A vida é pacata, mas sorri. E o velho Machado faz as pazes com ela, um pouco antes de se despedir.
Fonte: coleção obras-primas - grandes autores - vida e obra.
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