quinta-feira, 26 de agosto de 2010

A.A. Parada: Um Barco Encalhado por Baco


Continuação - A.A. Parada (Coisas e Gente da Velha Macaé):
Um Barco Encalhado por Baco.

Dois desastres marítimos, que culminaram com a perda preciosa de vidas e embarcações, tiveram repercussão na Macaé da última metade do século passado.
O primeiro, ocorrido a 28 de novembro de 1861, com o vapor "Hermes", vai relatado em outras páginas dêste livro.
O segundo, verificado num outro novembro, precisamente aos 22 dias dêsse mês do ano de 1877, fez naufragar, próximo às Ilhas de Sant´Ana, o vapor "Barão de Goitacaz", da frota costeira da Companhia Macaé e Campos, quando voltava da Côrte para o seu ancoradouro, na enseada de Imbetiba.
A catástrofe do "Barão de Goitacaz" também é conhecida dos macaenses, contada que foi, há poucos anos, pela pena brilhante e sempre moça de Cezar Mello que, com o pseudônimo de Zé Marcello (inteligente arranjo das letras de seu nome), era o responsável pela secção "Macaé antiga e curiosa" mantida nas páginas de "O Rebate".
Aqui, nêste desfilar de coisas antigas de nossa terra, iremos ocupar-nos com um outro desastre marítimo.
Êste, entretanto e felizmente, não será pintado com as côres negras necessárias para aquêles.
Pelo contrário! Malgrado a classificação de "desastre" que deve ser dada a um encalhe de navio, há, em sua história, uma rósea côr de humorismo e graça.
Tivemos conhecimento do fato ao compilarmos um manuscrito a guisa de diário, de José Carneiro da Silva, 1. Visconde de Araruama, tronco da nobre família Araruama, de Quissaman, documento antigo e precioso que nos foi permitido consultar pela gentileza da exma. Dona, Clarisse Carneiro da Silva Caldas, espôsa do dr. Jorge Caldas, descendente direta do referido 1. Visconde de Araruama.
Assim, relata êle que a 27 de abril de 1810, "pelas onze horas da noite" deu à costa "na altura de 22 graus e 14 minutos, uma pequena fragata ou galera de três mastros, composta a sua equipagem de inglêses, chineses, espanhois, portugueses asiáticos e um genovês, ou holandês".
Não cita o 1. Visconde de Araruama o nome da galera, mas conta que a mesma vinha rumo ao Rio de Janeiro, em viagem que se iniciara a 2 do mesmo mês, no Cabo da Boa Esperança, com a embarcação provida de pouca carga e sendo ela de recente propriedade de um inglês, comerciante no Rio de Janeiro, "que a tinha mandado comprar no rferido Cabo e custou-lhe 25.000 pêsos espanhóis".
A viagem, ao que se presume, transcorreu normalmente até o dia 27. À tardinha, como pretendesse entrar no Rio de Janeiro no dia seguinte, resolveu o capitão comemorar o final da viagem e deu ordens ao cosinheiro paa que o jantar normal e corriqueiro de todos os dias convertido fôsse em "um banquete mais largo principalmente em vinho".
O "mais largo" a que se refere o manuscrito, deve ter sido de largura medida em quilômetros, pois o estado físico dos participantes do banquete, findo êste, foi tão precário que, capitão à frente, foram todos deitar-se, a curtir no aconchêgo das cobertas e do travesseiro, a terrível carraspana.
O capitão da galera "entregou a direção da embarcação a um inglês dizendo-lhe que até a meia-noite fizesse um bordo para a terra e da meia-noite para diante fizesse para o mar, para montarem o Cabo-Frio".
Talvez por nefasto efeito dos vapores, que à cabeça lhe subiram por conta do bom e "largo" vinho ingerido, talvez por sua natural incompetência (quem lá sabe?), o fato é que os cálculos do capitão foram totalmente errados: antes da meia-noite, exatamente às onze horas, ou seja, antes que, de acôrdo com suas ordens, fôsse feita a deriva para o mar, a embarcação encalhou em areias macaenses.
E, embora classificando de "errado" o cálculo, não deixa o 1. Visconde de Araruama, em seu manuscrito, de apresentar a justificativa do capitão amigo de Baco: "é certo que o capitão me disse que o que lhe fez tão depressa chegar à terra foi a grande correnteza que as águas faziam para a terra, o que não tinha percebido de dia.".
Ao que nos parece, porém, as justificativas dêsse capitão de nome desconhecido, bem merecem a aplicação daquele ditado "desculpa de amarelo é a friagem".

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