quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Irvin D. Yalom - Quando Nietzsche chorou




Quando Nietzsche chorou / Irvin D. Yalom; tradução de Ivo Korytowski. - Rio de Janeiro: Ediouro, 2005.


"Viver com segurança é perigoso"

"Quando Nietzsche chorou", conforme postagem anterior (haja choro) em que mencionei o filme, que certamente difere em muito do conteúdo do nobre livro. Fica a sutileza do tema, entretanto, não puxando brasa para a leitura do livro, mas o livro é para uma vida. Belíssimo!

Felicíssima pelo retorno do amado livro Quando Nietzsche chorou o que permitirá uma releitura (assim que possível trago uma foto do estimado) agora com maior observação aos pontos neste raro (literalmente falando pois em rede não encontrei) livro de história comovente e bem forjada onde há o entralaçamento entre ficção e realidade. Irvin Yalom leva o leitor a participar de discussões profundas das dores da alma através de diversos encontros que ocorreram entre os irresistíveis personagens doutor Josef Breuer, o filósofo Friedrich Nietzsche e o jovem médico Sigmund Freud.

No final do século XIX Josef Breuer está envolvido em uma atmosfera de glórias, após curar uma paciente através de seu novo método de tratamento, a "terapia através da conversa". O que deveria ser seu melhor momento se revela num grande tormento - ele tem obsessivas fantasias sexuais com Anna O., a paciente recém-curada, e em decorrência disso sofre de insônia e pesadelos.

De férias em Veneza, Breuer encontra a jovem russa Lou Salomé que lhe pede um favor: tratar da depressão suicida de seu amigo Friedrich Nietzsche.

21 de Outubro de 1882
"Doutor Breuer,
Preciso vê-lo para um assunto da maior urgência. O futuro da filosofia alemã está em jogo. Encontre-me amanhã cedo às nove horas no Café Sorrento."
                                                                                                    Lou Salomé"

O filósofo alemão já tentara tratamento com dezenas de médicos em toda a Europa e quase sempre seu orgulho e a natureza de seu sofrimento se configurariam em obstáculos intransponíveis. O que se estabelece entre eles é uma relação na qual as funções de médico e paciente se confundem, pois Breuer encontra na filosofia de Nietzsche algumas respostas para suas próprias dores existenciais.

"Terá sido apenas a duas semanas que tentei manipulá-lo para revelar algum pequeno fragmento de si, que reclamei com Max e Frau Becker sobre o sigilo dele, que levei meu ouviso aos lábios dele para ouvir: "Ajude-me, ajude-me", que lhe prometi: "Conte comigo"?
Por que, então negligenciei-o hoje? Terei ficado ganancioso? Esse processo de aconselhamento - quanto mais se estende, menos o compreendo. Porém, é irresistível. Cada vez mais, penso em minhas conversas com Nietzsche; às vezes chegam a interromper uma fantasia com Bertha. Essas sessões se tornaram o centro de meu dia. Sinto-me ansioso pela minha sessão e, com frequência, mal consigo esperar pela próxima. Será por isso que deixei Nietzsche  me desnudar hoje?
No futuro - quem sabe quando, talvez daqui a cinquenta anos? -, esse tratamento através da conversa poderá tornar-se corriqueiro. "Médicos da angústia" se tornarão uma especialidade típica. E as faculdades de medicina, ou talvez os departamentos de filosofia, os treinarão.
O que deveria contar o currículo do futuro "Médico da angústia"? No momento, posso estar certo de uma caderia essencial: "relacionamento"! É aí que a coisa complica. Assim como os cirurgiões precisam primeiro aprender anatomia, o futuro "médico da angústia" precisa primeiro entender o relacionamento entre o que aconselha e o aconselhado.
Observar um relacionamento não é fácil quando eu mesmo faço parte dele. Entretanto, noto tendências impressionantes.
Acreditava que pudesse ajudá-lo. Isso não mais ocorre. Tenho pouco a lhe oferecer. Ele tem tudo a me oferecer."

Bela passagem o encontro de Breuer e Nietzsche acerca da memória paterna:

"- Acima de tudo, acho que sinto falta de sua atenção. Ele sempre foi minha principal platéia, mesmo no finalzinho da vida, quando sofreu grande confusão mental e perda de memória. Eu não deixava de lhe contar meus sucessos, meus triunfos de diagnósticos, minhas descobertas nas pesquisas, mesmo minhas doações de caridade. Mesmo depois de morrer, continuou sendo minha platéia. Durante anos, imagineio-o espiando por cima de meus ombros, observando e aprovando minhas realizações. Quanto mais sua imagem se desvanece, mais luto contra o sentimento de que minhas atividades e meus sucessos são todos evanescentes, de que não têm significado real.
- Está dizendo, Josef, que se seus sucessos pudessem ser registrados na mente efêmera de seu pai, 'então' possuiriam significado?
- Sei que é irracional. Parece muito com a questão do som de uma árvore que cai numa floresta vazia. A atividade não observada terá um significado?
- A diferença é, claramente, que a árvore não tem ouvidos, enquanto é você próprio que confere significado.
- Friedrich, você é mais auto-suficiente do que eu... mais do que qualquer pessoa que conheci! Lembro-me de ter admirado, em nosso primeiro encontro, sua capacidade de florescer sem qualquer reconhecimento dos colegas.
- Há muito tempo, Josef, aprendi que é mais fácil enfrentar uma má reputação do que uma má consciência. Ademais, não sou ganancioso; não escrevo para a turba. E sei ser paciente. Talvez meus discípulos ainda não tenham nascido. Somente o depois de amanhã me pertence. Alguns filósofos nascem postumamente!

Freud, não menos importante, entretanto, em início de carreira (na época) tem participação menos atuante na referida ficção. Deixo aqui minha contribuição ao ilustre o qual sou grande admiradora pelo fato do nobre ter sido grande leitor chegando ao ponto de receber castigo paterno por ter gasto além que suas parcas economias na compra de livros, livros e mais livros (isto aos 17 anos, ainda um jovem estudante iniciante nas letras).

Era isto, inté!
Irvin D. Yalom é Psicoterapeuta e professor de psiquiatria da Escola de Medicina da Universidade de Stanford, com vários títulos na área acadêmica.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

LinkWithin

Related Posts with Thumbnails