sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Francisca Júlia da Silva


Francisca Júlia

"Mergulha o teu olhar de fino colorista
No azul: medita um pouco, e escreve; um nada quase"
(Francisca Júlia)

Francisca Júlia, a única mulher no Brasil a se destacar no Parnasianismo, uma escola de estilo sóbrio e conservador, foi incentivada  a ler pelo pai, advogado, e pela mãe, professora. Aos oito anos, mudou-se com a família para São Paulo. Aos 20 começou a escrever para o Correio Paulistano, o Diário Popular e o Estado de S. Paulo - no qual publicou seus primeiros poemas -, e também para a imprensa carioca, destacando-se as revistas O Álbum, editada por Arthur Azevedo, e A Semana.

O livro de estréia de Francisca Júlia reuniu os sonetos publicados durante três anos na imprensa. Segundo Manuel Bandeira, "o seu livro Mármores (...) foi entusiasticamente saudado pelos mestres parnasianos, e com razão, pois talvez em nenhuns outros versos se encontre como nos da poetisa paulista mais extremamente realizado o ideal de impassível beleza, que era a aspiração da escola."
Apesar do sucesso, Francisca Júlia só lançou outro livro de poemas, Esfinges, oito anos depois. Nesse período, editou em colaboração com o irmão, o também escritor Júlio César da Silva, o Livro da infância, adotado pelas escolas de 1. grau do estado de São Paulo. De acordo com Benjamin de Abdala Júnior, Esfinges  "mostrou seu encaminhamento para a tendência religiosa do Simbolismo". Pode-se observar que sua obra tem duas fases distintas: parnasiana, em Mármores; e simbolista, em Esfinges. Deste último, disse o crítico Aristeu Seixas: "Nenhuma pena manejada por mão feminina, seja qual for o período a que remontemos, jamis esculpiu, em nossa língua, versos que atinjam a perfeição em par e a beleza estonteante dos concebidos pelo raro gênio da peregrina artista."

Em 1909, a poetisa casou-se com o telegrafista Edmundo Munster, deixando a vida liter´ria para dedicar-se ao lar. Só publicou mais um livro, o infanto-juvenil Alma infantil, também em parceria com o irmão. Conhecida como a "musa impassível", sua morte veio a demonstrar que, na vida particular, Francisca Júlia não era nada impassível: inconformada e bastante abalada com a morte do  marido tuberculoso, a poetisa ingeriu uma dose letal de narcóticos e morreu no dia seguinte, em pleno velório do esposo, sendo sepultada no feriado de finados.

Curiosidade
Sua estréia na revista A Semana, uma das mais conceituadas da então capital federal, causou grande alvoroço. Seus redatores, escritores famosos da época, a princípio não acreditaram que aqueles versos tão perfeitos tivessem sido escritos por uma mulher. João Ribeiro chegou a comentar: "Isto não é verso de mulher! Deve ser uma brincadeira do Raimundo Correia!"

"Em Francisca Júlia, surpreendeu-me o respeito da língua portuguesa, (...) que traz para a arte escrita todas as suas delicadezas de mulher, toda a sua faceirice de moça, nada perde da sua pureza fidalga de linhas. O português de Francisca Júlia é o mesmo antigo português, remoçado por um banho maravilhoso de novidade e frescura."
(Olavo Bilac)


"Nem aqui,nem no sul nem no norte, onde agora floresce uma escola literária, encontro um nome que se possa opor ao de Francisca Júlia. Todos lhes são positivamente inferiores na estrofe, na composição e fatura do verso, nenhum possui e tal grau o talento de reproduzir as belezas clássicas com essa fria severidade de forma e de epítetos que Heredia e Leconde deram o exemplo na literatura francesa."
(João Ribeiro)

"Muito pouco se escrevem sobre o maior vulto feminino do Parnasianismo brasileiro. Num universo inteiramente dominado por poetas do chamado sexo forte, Francisca Júlia provou que mulher também sabia fazer poesia de qualidade."
(Roberto Flores)


À noite

Eis-me a pensar, enquanto a noite envolve a terra;
Olhos fitos no vácuo, a amiga pena em pouso,
Eis-me, pois, a pensar... De antro em antro, de serra
Em serra, ecoa, longo, em réquiem doloroso.

No alto uma estrela triste as pálpebras descerra,
Lançando, noite adentro, o claro olhar piedoso.
A alma das sombras dorme; e pelos ares erra
Um mórbido langor de calma e de repouso...

Em noite escura assim, de repouso e de calam,
É que a alma vive a dor exulta, ambas unidas,
A alma cheia de dor, a dor tão cheia de alma...

É que a alma se abandona ao sabor dos enganos,
Antegozando já quimeras pressentidas
Que mais tarde hão de vir com o decorrer dos anos.


Nasce no dia 31 de agosto, em Xiririca (atual Eldorado) - SP
Morre em 1. de novembro, em São Paulo - SP

Obras da autora
POESIA: Mármores, 1895; Esfinges, 1903.
INFANTO-JUVENIL: Livro da infância (com Júlio César da Silva), 1899; Alma infantil (com Júlio César da Silva), 1912.

Fonte: 100 Anos de Poesia - Um panorama da poesia brasileira no século XX

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