quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Joseph Conrad

Joseph Conrad

1857 - Em 3 de dezembro, em Terechowa, Polônia,nasce Teodor Joseph Conroad Korzeniowski, filho único de Apolo Nalecz Korzeniowshi e Evelina Bobrowska.

1861 - Em novembro, o pai é preso por razões políticas.
1862 - Conrad acompanha a família no exílio, na Rússia.
1864 - Morre sua mãe, aos 34 anos de idade.
1868 - Conrad e o pai deixam o exílio e vão morar na Polônia austríaca.
1869 - Morre Apolo Korzeniowshi.
1874 - Em outubro, Conrad parte para Marsella.
1875 - Realiza sua primeira viagem marítima.
1876 - A bordo do Santo Antônio, conhece Dominic Cervoni.
1878 - Em julho, desembarca em Lowestoft, Inglaterra.
1880 - Obtém o grau de segundo-tenente da Marinha Mercante inglesa.
1881 - 1883 - Viaja para Bangcoc, a bordo do navio Palestina.
1886 - Naturaliza-se cidadão britânico.
           Consegue o grau de capitão.
           Inscreve-se num concurso literário com o conto O Marujo Negro.
1887 - Viajando pelo arquipélago malaio, conhece o mestiço Almayer.
1889 - Desiludido com a tripulação, renuncia ao comando do Otago.
            Começa a escrever A Loucura de Almayer.
1890 - Viaja para a Polônia, após dezesseis anos de ausência.
1895 - Publica A Loucura de Almayer.
1896 - Casa-se com Jessie George.
            Publica Um Pária das Ilhas.
            Inicia a redação de Juventude.
1897 - Publica O Negro do Narciso.
1900 - Publica Coração das Trevas e O Espelho do Mar.
            Inicia a redação de Fortuna.
1919 - Conclui Salvador.
1924 - Em 3 de agosto, Joseph Conrad morre.

(*) Lord Jim
Escrito em 1900, Lord Jim descreve aventuras emocionantes nas paisagens exóticas da Malásia, onde aventureiros se aproveitam da simplicidade dos nativos para satisfazer sua cobiça de lucros e de poder.


Os passos dos soldados russos ressoam como batidas de tambor. Dentro da casa, rostos aterrados se voltam para a porta. Os lábios deixam escapar uma oração. Joseph, agarrado à mãe, fixa o olhar no pai, Apolo Nalecz Korzeniowski. Os soldados estão mais próximos. De um golpe, a porta se abre: alguns apontam as armas; outros vasculham a casa. Finda a busca, tomam Apolo pelo braço e saem, empurrando-o. Joseph continua junto da mãe, Evelina, sem derramar uma lágrima. Não tinha ainda quatro anos e não entende o que se passa. A cena, no entanto, ficaria gravada em sua lembrança. Adulto, lamentaria não ter participado das lutas de libertação de seu país.

Desde meados do século XVIII, três grandes potências européias - Áustria, Prússia e Rússia - cobiçavam o território polonês. Em 1772, valendo-se da fraqueza do governo da Polonia, invadiram o país e dividiram-no entre si. Cerca de vinte anos depois, não reconhecendo a constituição promulgada pelos poloneses ainda livres, a Rússia anexou mais uma parte da terra vizinha. Em 1793, numa terceira partilha, as tropas do czar apoderaram-se da Podólia, região da Polônia onde Joseph Conrad nascera. Apesar de suas tendências literárias, Apolo, como tantos outros patriotas, não podia deixar de tramar a expulsão dos invasores. Sua casa vivia cheia de conspiradores, não raro vestidos de preto, como a ostentar luto nacional, ou envergando trajes típicos, como a exibir a tradição popular. Muitas vezes o pequeno Joseph vira essa gente circular por sua casa, sentar-se junto à lareira, discutir métodos e planos de ação. Por fim, uma denúncia fora ter às autoridades: os policiais calaram os conspiradores e levaram preso o chefe da rebelião.

No cárcere, Apolo esperou seis meses até conhecer a pena imputada a seu crime. Considerado da mais alta periculosidade para o império do czar, foi deportado para Perm, na Rússia. O local era uma paragem erma e gelada, sem brilho de sol, onde a família via consumir-se a vida, sem possibilidade de deter o desastre.

A conduta da mãe naquele tempo amargo jamais se apagou da memória de Joseph: "Ela enfrentou com calma as provações de uma vida que refletia todos os sofrimentos nacionais e sociais da comunidade". Preocupado com o destino da irmã e valendo-se de suas relações com os russos, Stanislau Bobrowski conseguiu que Evelina e o filho deixassem por três meses a solidão do Perm e passassem esse tempo em sua propriedade de Nowofastoff. O menino descobriu o que era brincar, correr pelas ruas com crianças de sua idade. Não sabia que em curto prazo haveria de voltar a Perm e que, na primavera de 1864, sua mãe morreria. O exílio tornou-se ainda mais amargo, com o pai isolado em sua mágoa. Conrad ficou entregue à solidão. Quando Apolo percebeu que o menino definhava, enviou-o à casa de Tadeu Bobrowski, o tio predileto do pequeno.

Terminado o desterro dois anos depois, um comunicado oficial autorizou Apolo a voltar para a Polônia, já que, doente e envelhecido, não constituía ameaça para o invasor. Restava-lhe pouco tempo para respirar o ar da pátria. Na primavera de 1869, faleceu, suscitando no povo de sua região um lamento sentido. Deixou ao filho um conselho: tornar-se um bom polonês.

Em 1917, conhecido e comentado nos quatro cantos da Inglaterra, Joseph Conrad declarou a respeito de sua obra: "Chamaram-me de escritor do mar... Toda a minha preocupação foi chegar ao valor 'ideal' das coisas, dos acontecimentos, dos seres".

A princípio, o mar era para ele apenas um gigante imaginário, conhecido por intermédio de Victor Hugo e James Cooper, cujos livros despertaram em Joseph o desejo de se fazer marujo. Tal propósito provocou discussões, e tio Tadeu, ainda que disposto a concordar com o sobrinho, sugeriu-lhe que primeiro concluísse os estudos básicos. Mas Conrad insistia. Os anos de isolamento na paisagem monótona do exílio lhe haviam posto na alma a tentação das andanças pelo mundo. A família teve de se resignar e deixá-lo partir, esperando apenas que desistisse quanto tivesse de enfrentar as dificuldades da vida de marinheiro. Num dia de outubro de 1874, Conrad embarcou para Marsalha. E pisou pela primeira vez num navio rumo às terras da Martinica. Não se cansava de admirar a vastidão das águas brilhando ao sol intenso ou luzindo ao luar das Antilhas. Ao desembarcar em terra firme, já suspirava pela oportunidade de navegar outra vez.

Na segunda viagem, a bordo do Santo Antônio, Conrad conheceu um homem que exerceria extraordinária influência em sua vida e em sua obra: Dominic Cervoni, corso moreno e forte, retratado em O Espelho do Mar como um navegador experimentado, sério e irônico. Com ele, aprendeu a ver os homens e o mundo com ceticismo,o s perigos com serenidade. Por intermédio dele, participou da primeira aventura política.

O príncipe Dom Carlos, irmão do falecido Fernando VII, rei da Espanha, reivindicava o direito de sucessão ao trono espanhol, ocupado por sua sobrinha Isabel. O povo dividiu-se em facções opostas, que não tardaram em se defrontar. Em Marselha, nos cafés à beira do cais, o problema espanhou era assunto do dia, e Cervoni, Conrad e um americano chamado Blunt abraçaram a causa carlista. Durante meses transitaram pelo Mediterrâneo contrabandeando armas para os rebeldes, até que, descobertos pelos legalistas, foram obrigados a afundar o barco para salvar a vida. O episódio levou Conrad a viver também o primeiro caso amoroso. Uma dama, carlista fervorosa, suposta amante de Dom Carlos, provocara não só o amor de Conrad mas ainda a paixão de Blunt. Por causa dela, os dois bateram-se em duelo, em fevereiro de 1878, saindo ambos feridos. O gesto não comoveu a dama, que os deixou e continuou lutando em prol de seu príncipe. Esses acontecimentos levaram Conrad a abandonar Marselha e a embarcar para Londres. Sem saber inglês, levando pouco dinheiro, mas animado pela energia de seus 21 anos, desembarcou na Inglaterra no verão de 1878, disposto a aprender a língua e a ganhar a vida.

O aprendizado do inglês começara com toscos diálogos a bordo do Espuma do Mar, aos quais se acrescentara a leitura dos jornais, cujo vocabulário fugia totalmente ao linguajar dos marujos. Conrad costumava recorrer também a uma edição completa de Shakespeare, cujas obras conhecera desde a infância, por meio de uma tradução feita por seu pai. Os esforços para aprender a língua não visavam à expressão literária; bastava-lhe ter um meio suficiente para sobreviver e obter o grau de oficial.

Em 1880, quase dois anos depois de ter pisado em solo inglês, submeteu-se aos exames regulares para o posto de segundo-tenente da Marinha Mercante, sendo aprovado com distinção. Tio Tadeu entusiasmou-se com o progresso do sobrinho. Nas cartas que lhe escreveu por essa época, louvou-lhe os esforços, incentivou-o e insistiu para que se naturalizasse inglês.

Nos seis anos entre a obtenção do grau de segundo tenente e o certificado de súdito britânico, Joseph Conrad viajou. Foi acumulando muitas experiências, e uma o marcou profundamente, servindo de partida para o romance Lorde Jim, que publicaria em 1900: o naufrágio do Palestina, que no livro recebeu o nome de Patna. Tal como em Lorde Jim, Conrad, após a catástrofe, foi para o Oriente. Permaneceu em Cingapura durante algumas semanas e voltou ansiosamente a Londres, para prestar os exames de tenente.

Após conseguir o grau de oficial, foi a Marienbad, onde visitou tio Tadeu e vários amigos poloneses. Como homem do mar, faltava-lhe apenas preencher mais um estágio: alcançar o posto de capitão. Foi só após o ter conseguido que se inscreveu pela primeira vez num concurso literário, apresentando o conto O Marujo Negro. Estava pronto para zarpar rumo a uma nova aventura.

A vida de Conrad poderia ser narrada a partir dos navios em que peregrinou pelos mares do mundo, perfazendo um longo caminho, marcado de curvas e viravoltas, e que estranhamente o conduziu à literatura. Desiludido com a viagem feira a bordo do Otago, iniciou sua primeira narrativa longa inspirada num curioso personagem que conhecera a bordo do Vidar: o comandante dessa embarcação morrera encerrado em seu camarote, tocando violino ininterruptamente e abandonando a tripulação à desordem e à doença. Conrad assumira o comando e conseguira a duras penas vencer as baixas, os vandavais, a febre que o acometera, e finalmente chegar a Bangcoc, onde permanecera encerrado no hospital.

Ao se restabelecer, enclausurou-se em seu apartamento junto ao Tâmisa em Londres, deixando por algum tempo os riscos do mar.

Nesse período de ócio, começou a escrever o relato das ilusões de Almayer, o holandês mestiço que conhecera a bordo do Vidar, quando vagava pelas ilhas do arquipélago malaio, em 1887. No apartamento londrino, Conrad recordava as cenas do paraíso tropical que percorrera, valendo-se não só de sua memória mas também de anotações rabiscadas às pressas no Vidar.

Não escreveu a obra toda de uma só vez. Em 1889 interrompeu-a para ir a Varsóvia, pisando o solo polonês após dezesseis anos de ausência, e abraçar o velho Tadeu e os parentes saudosos. No ano seguinte, partir para o Congo, única viagem da qual se arrependeu amargamente. Imaginara a África como terra livre e selvagem, onde a vida era mais intensa. Mas ao chegar lá não encontrou a vitalidade que desejava ver e decepcionou-se. A serviço da Sociedade Anônima Belga para o Comércio no Alto Congo, Conrad deveria comandar o Flórida, transportando mercadorias para os portos da costa congolesa. O diretor da Sociedade, entretanto, deu-lhe o comando de outro barco, destinando unicamente à navegação fluvial. O trabalho, os companheiros, o clima e a malária fizeram-no largar tudo e voltar para Londres, apesar do grande prejuízo econômico que tal decisão lhe acarretaria.

Ao se referir posteriormente a esse fato, resumiu-o como "uma longa enfermidade e uma triste convalescença", a partir das quais o escritor desabrochou em toda a plenitude, pois, enquanto se restabelecia dos transtornos causados pela estada no Congo, retomou e redigiu grande parte de A Loucura de Almayer. A composição inteira da obra estendeu-se por mais dois anos, entremeada de viagens e de luto. Fazia um mês que Conrad retornara a Londres, desembarcando do Alowa e disposto a não mais navegar, quando recebeu o telegrama que comunicava a morte do tio Tadeu. Julgou que a única homenagem que lhe poderia prestar seria dedicar-lhe a obra. Terminou-a em abril de 1894 e enviou-a a um editor londrino. Em outubro soube que A Loucura de Almayer fora aceita.

A crítica recebeu com aplausos a estréia, e o público esgotou a primeira edição em poucos meses. A história do holandês que se destruíra numa aldeia da Indonésia e o ambiente primitivo seduziram os leitores. Em suas vidas rotineiras, sufocadas pela fumaça das cidades, a paisagem primitiva era um jato de ar puro, um devaneio rico de cores e emoções.

Em meio a todos esses acontecimentos, o amor que Conrad andara buscando se revelou: Jessie George. Mandava-lhe flores, visitava-a de vez em quando, contava-lhe episódios pitorescos de suas numerosas viagens. Percebia nos olhos dela o agrado com que o recebia, mas jamais tivera a coragem de lhe declarar amor. Numa tarde, voltavam juntos de um passeio, quando a chuva os pegou de surpresa. Correndo como adolescentes, de mãos dadas, refugiaram-se no saguão da Galeria Nacional, e, com a voz abafada pela emoção, o escritor propôs casamento à moça. Em três meses estavam casados, prontos para embarcar rumo à Bretanha. A felicidade que encontrou levou-o a esquecer um pouco a literatura. Não queria saber o que achavam de seus livros, não pensava escrever nada. A própria Jessie teve de lhe chamar a atenção para as críticas ao seu segundo romance, Um Pária das Ilhas, lançado em 1896. Dentre os comentários, Conrad interessou-se por um artigo anônimo publicado na Saturday Review. Solicitou à revista que o pusesse em contato com o crítico que tão vem considerava se trabalho, e assim conheceu o escritor H. G. Wells. Foi o início de uma amizade duradoura, de longas conversas na residência de Conrad em Pent Farm, onde tinha como vizinho Henry James. Na Bretanha, retomou as lembranças do arquipélago malaio e iniciou a composição de Salvador, trabalho que seria interrompido vezes sem conta por motivo de doença. Nessa época a chegada de vários pertences seus, enviados do Congo, inspirou-lhe Um Posto Avançado do Progresso. Em seguida iniciou o romance O Negro do Narciso, que seria publicado em 1897.

No outono de 1896 regressou à Inglatera e estabeleceu-se em Essex, de onde remeteu a Henry James um exemplar de Um Pária das Ilhas. Mais tarde recebeu do novelista um livro de sua autoria e um convite para jantar. De todos os literatos com quem Conrad privou, certamente James é o que mais se aproxima dele. Ambos costumavam utilizar como narrador de suas histórias um dos personagens, cuja visão unilateral dos acontecimentos se completa com a dos outros. Desse modo, o leitor tem pelo menos dois ângulos da história, duas visões do herói, e pode julgá-lo com maior objetividade.

Ao nascer seu primeiro filho, em 1896, Conrad novamente suspendeu Salvador, e reservou esse ano para a criação de duas obras-primas: Juventude e Coração das Trevas. Lorde Jim veio a seguir. O personagem central, um marinheiro inglês acusado de haver deixado naufragar seu navio, revela muitas semelhanças físicas e psicológicas com o próprio Conrad. Serve-se das viagens como fuga, atormentado por um obscuro sentimento de remorso. A morte para ele é redenção dos erros pessoais: o de não haver impedido o naufrágio e o de não ter podido rechaçar os invasores da aldeia que adotara como lar. Conrad igualmente se lamentou durante a vida inteira por não haver lutado pela libertação de sua pátria.

Mais de dez anos após a publicação de Lorde Jim, Conrad concedeu entrevista a um jornalista polonês: "Os críticos ingleses, comentando minhas obras, sempre acrescentaram que encontram nelas coisas incompreensíveis, imperceptíveis. Só vocês, poloneses, podem perceber aquele imperceptível, compreender aquele incompreensível, porque é o que eu tenho em mim de polonês". Foi cultivando esse incompreensível que Joseph Conrad encontrou sua forma pessoal de lutar pela sobrevivência da chama polonesa. Conrad, apesar de se encontrar longe da pátria, até a morte, no ano de 1924, deixou esmorecer em si o corajoso espírito de seu povo.


Fonte: coleção obras-primas - grandes autores - vida e obra.

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