quarta-feira, 1 de julho de 2015

Charles Dickens - Grandes Esperanças

Charles Dickens - Grandes Esperanças

"O lar nunca fora um lugar muito agradável para mim, por causa do temperamento da minha irmã. Mas Joe o santificava, e antes eu acreditava no meu lar. Antes eu acreditava na sala de visitas de cerimônia, como um salão dos mais elegantes; acreditava na porta da frente, como um portal misterioso do templo sagrado cuja abertura solene era marcada por um sacrifício de aves assadas; acreditava na cozinha como um cômodo casto, ainda que não magnífico; acreditava na ferraria como o caminho reluzente da maturidade e da independência. No decorrer de um ano, tudo isso mudara. (...) A mudança ocorrera em mim; era um fato consumado. Bom ou mau, desculpável ou indesculpável, era um fato" (p.166).

Na Estante, por Fernanda Pompermayer, Cidade Nova - Junho 2015 - n. 6, pág. 44 resenha A obra de Dickens.


"Segundo o escritor inglês Bernard Shaw (1856-1950), Grandes Esperanças é uma obraa "absolutamente perfeita". É impossível não concordar. Essa é a impressão que se tem desde as primeiras páginas. Trata-se de um texto inebriante pela qualidade da narrativa, pela profundidade do conteúdo, e pela maestria de Dickens ao descrever ambientes, personagens, relações... Para quem gosta de ler, é um prato cheio, a degustação de um vinho de excelente safra e de incomparável buquê.
Quem já leu Charles Dickens deve ter gravado na memória os dramas de crianças órfãs maltratadas por padastros rancorosos (David Copperfield) ou exploradas pela revolução industrial na Inglaterra dos séculos 18-19 (Oliver Twist).  De fato, Dickens foi um dos precursores da crítica social na literatura inglesa. Quando ele começa a publicar seus romances, Londres já é uma metrópole com 1,5 milhão de habitantes, muitos deles migrantes do campo em busca de emprego na indústria têxtil. O trabalho infantil, em regime de escravidão, é a coisa mais normal do mundo e as más condições de vida algo tido como muito natural. Depois de escrever vários romances, entre dezembro de 1860 e agosto de 1861, Dickens se dedica a uma outra história, que publicará semanalmente na revista All the Year Round, como um folhetim.  É o que resultará, depois, no livro Grandes Esperanças, considerado pela crítica a sua obra-prima. O pano de fundo de uma Inglaterra fragmentada em classes - na qual a mobilidade social é um sonho desejado, mas raramente alcançado - continua presente. Assim como as agruras e privações a que são submetidos os pobres e outros degredados, como os presidiários, por exemplo.

A beleza de Grandes Esperanças, além do encanto da pena de Dickens, está na profundidade de uma saga pessoal e familiar. A história de Philip Pirrip (Pip), o personagem principal, é uma experiência profundamente humana, em todas as suas nuances. Há o sonho de uma vida melhor, amor e ódio, amizade, respeito e desonestidade, inveja, ambição, orgulho e humildade. E principalmente dignidade. A experiência humana de Pip, que conhecemos como um garoto órfão e acompanharemos até a maturidade, passará por várias fases e por desdobramentos quase surreais para uma única pessoa... Mais do que uma biografia, são várias, todas expressões da alma humana. Dickens é filho de sua época, portanto, mesmo sem se deixar condicionar por um final feliz, os valores morais são sempre vencedores e têm a última palavra. É um livro de grandes sentimentos e, por isso, supera o tempo e atravessa a história.


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